2013/05/11

Sonhos de outono


Desejou, cansou, aconteceu

- Você pode dormir lá em casa.
- Mas você não trabalha amanhã cedo?
- Trabalho, mas você pode ficar lá dormindo.

Estavam na rua da casa dela, faltando umas três casas pra chegarem à dela. O assunto era um aleatório qualquer.
Mas deixa eu contar uma coisa: Ele era louco por ela. Era. Perdera a pira há um tempo, umas decepções. Cinco anos de convivência, mesma idade do desejo, que ele alimentava platonicamente. Alimentava. Cansou de querer e fazer nada.
Enquanto andavam, ele começou a encará-la de um jeito “quero você, moça”, como sempre acontecia sob efeito do álcool. Ele nem ouvia o que ela dizia, mas acompanhava hipnotizado o movimento dos lábios dela.
Ela parou na frente da casa pra pegar algo na bolsa e ele a pegou, a puxou e a beijou. Inesperadamente, impulsivamente. E foi o beijo. Todo sincronizado, intenso. Aí ele começou a mordiscar os lábios da moça. Leves mordidas por toda a extensão da boca dela, percorrendo cada centímetro daquele depósito de batom vermelho. Desceu para o queixo. Foi para o ombro, começou a cheirar e beijar do ombro ao pescoço da mulher. E ela, ofegante. Tudo isso no meio da rua, com o risco de serem flagrados pelos pais dela. Ela interrompeu o rapaz, disse gritante:
- Até que enfim.
Ele disse nada
Entraram. Todo mundo em casa. Foram dormir, ela no quarto dela que dividia com o irmão. Ele, num colchão jogado na lavanderia. E ele dormiu. Feito uma pedra, desabou em euforia. Há tempos sua mente intranquila não vivia tempos de paz. Não queria mais (beijar a moça), mas não sabia porquê fizera aquilo naquela noite específica sem planejamento nem texto. Ela nem dormiu, ficou encarando o teto com sorriso espontâneo, coisa que ela não fazia questão de fazer sempre. Se cochilou, foi pouco, mas teve dificuldade para fechar seus olhos lotados de alegria.
Ela acordou, botou a roupa e foi pra cozinha preparar café. Intencionalmente, fez muito barulho pra pegar a chaleira no armário. A cozinha era próxima da lavanderia, qualquer ruído num lugar, era refletido noutro. Ele despertou com os barulhos, mas ficou num estado de êxtase sonífero, não se mexia. A bagunça na cozinha continuou.
Por mais que ela estivesse encantada pelo ocorrido e explodindo de mais vontade, ela sempre fora uma pessoa que não corria atrás. Parava, ficava, tinha medo. Preparou seu café, mas com a mente nos lábios do seu amigo.
Ela foi espiá-lo da porta. Ele percebeu e olhou. Ela fez um “pss” tímido, deu um tchauzinho sorridente e se foi... Foi-se trabalhar. Ele dormiu.



Aconteceu, desejou

- Você pode passar na casa da Xxxxx pra ajuda-la a montar as coisas?
- Mas eu mal conheço ela, só vi uma vez.
- Ela precisa de ajuda com as coisas do churrasco... E você é o único da galera que tá com tempo livre.

Tocou a campainha e ficou esperando, enquanto observava a vegetação do jardim. Xxxxx saiu da casa, acionou o controle do portão. Ele entrou, cumprimentou-a com aquele típico abraço tímido que as pessoas se dão quando se conhecem pouco.
- O que a gente tem que fazer então?
- Montar a lona lá fora e ir no mercado comprar as coisas.
A mãe de Xxxxx estava em casa e mandou os dois ao mercado, que era a prioridade. Xxxxx foi se arrumar e ele sentou no sofá pra esperar.
Eles já se conheciam de um outro rolê da galera. Obviamente, ele ficou a fim dela, mas nada, nem guardou-a na memória. Ela o achara interessante, qualquer homem de barba era interessante.
Xxxxx entrou na sala perguntando se iriam ao mercado de carro ou a pé, enquanto colocava  seu par de brincos. A tarraxa de um brinco caiu. Caiu no colo dele perto da malícia. Ele olhou pra ela. Desde a primeira e última vez que se viram, ele não havia lembrado da beleza da moça. Eles ficaram se encarando esperando que alguém reagisse. Ela perguntou se podia pegar. Ele disse que sim. Ela pegou, não a tarraxa. Ele a puxou para o sofá e se beijaram. Deram um longo e despreocupado amasso na sala, enquanto sabiam que a mãe dela estava nos fundos do jardim.
Levantaram-se desarrumados e foram ao mercado.
Saíram da casa renovados entre si. O comportamento dos dois mudara em relação aos dois. Era só risos e uma interação saudável.
Entraram no mercado e foram direto pra sessão de bebidas. Xxxxx disse:
- Vamos levar uma eristoff?
- Não, isso aí é negócio do demônio.
- Você não gosta?
- Gosto... Gosto quando eu quero me matar.
Seguiram brincando e xingando.
Indo ao caixa, ela mexeu na bolsa e botou um cigarro na boca. Ele:
- Cê sabia que não pode fumar aqui?
- Sim, é que se eu não pegar o cigarro agora, eu esqueço de fumar.



______________

Era segunda-feira, dia de faculdade e ele ainda pensava em Xxxxx. Não havia previsão para um novo encontro, mas ele ainda pensava nela.
Nunca acontecia nada demais em sua vida, muito menos romances. Mas em dois dias, ele ficara com uma amiga e uma outra.
Ele costumava chegar cedo na aula pra ficar na sala pensando. Ela chegou. Cumprimentaram-se como amigos e ela sentou-se na carteira vizinha.
A aula começou. Era filme. Compraram uns doces na cantina. E ela aproveitou para arrastar sua carteira próxima à dele.
Em todos os anos de amizade, ele ansiava por beijos dela. Tentou, cansou e chegou ao ponto da desistência. Não arriscava, não insistia. Principalmente, não dizia. Era de esperar que as pessoas entendessem as vontades dele sem que ele dissesse uma só palavra. Desistira da moça. E foi logo quando isso aconteceu, que o beijo aconteceu. Em todos os anos de amizade, ela gostava da amizade dele, nunca cogitara ficar com ele, apesar de achá-lo encantador.
Ao lado dele, ela não tirava o sorriso da cara e nem se preocupava em esconder. Depois do beijo, ela começou a deseja-lo fortemente. Durante o filme, encostou sua cabeça no ombro dele. A reação dele foi pegar na mão dela.
Duas colegas saíram da sala e logo o celular dela tocou. Ela leu a mensagem e saiu da sala. Voltaram as três cinco minutos depois. Uma delas olhou para ele e fez uma cara de “até que enfim, seu lento”.
Ela voltou a encostar-se nele. Pouco depois, dormiu.
Ele não sabia o que queria. Tinha uma ao seu lado, mas pensava na outra.

2013/05/08

A noiva


Mas eu caso contigo só umas dezoito vezes quando te vejo passar.
Mas esse teu batom bordô na tua boca te deixa ainda mais.
Mas eu vejo tua cara fechada e me abro de vontade.
Mas você passa... e eu passo do ponto.
Mas eu domino a arte do ficar quieto, mas querer gritar.
Mas eu exagero no silêncio, quando eu bem queria tua voz no meu ouvido.
Mas eu já falei contigo, te joguei uma dúzia de palavras e você fugiu da minha confusa abordagem.
Tô me preparando pra te ver passar e encarar “Ô, moça, casa comigo? Quer dizer... Posso te acompanhar até o ponto? Ou até o ponto final?"