2009/12/06

Sarjeta da Abstinência - Não me deixe sangrar

Graças à um morador de rua e seu cão, me livrei de três ou quatro caras, não lembro ao certo pois estava "chapada" demais, que queriam ir comigo à não lembro onde para "brincar", segundo eles.
Esse era o problema em ter vinte e quatro anos e um rosto de dezeseis, as pessoas, principalmente homens, queriam se aproveitar de minha inocência aparente. Bem, alguns conseguiram, por isso estava no estado em que Tomas me encontrou, drogada, suja e sem vida. Mas depois do que aconteceu entre eu e Sebastião lá em Portugal, minha mente mudou, fiquei mais perversa, maligna, e depressiva.
Tudo o que o meu mais novo companheiro de sarjeta, e salvador, quis em troca foi um gole de cachaça e comprimidos, pois precisava manter o vício. Dei a ele o exigido, pois eu já estava "semi-morta", não me faria falta. Um só comprimido não faria mal algum a ele, em comparação às doses que tomei... algumas várias, com cachaça pura. Então, não estava só lesada, e esperando a morte devido as dúzias de comprimidos, estava bêbada também. Pelo menos não quebrei a promessa que fiz ao meu avô antes de morrer. Ele me pediu que eu nunca fumasse, pois poderia ter câncer, doença que matou o homem mais bondoso do mundo. Bem, nunca fumei, mas bebi litros e mais litros de todo e qualquer tipo de bebida alcoólica e usei algumas outras drogas, tudo menos o cigarro. Não sou de quebrar promessas.
Meu amigo da calçada se despediu e partiu rumo a agitação noturna do Largo. Mas, o que um pobre miserável, sem um vintém, faria no Centro de Curitiba? Não faço ideia, mas qualquer coisa era melhor do que ficar esperando a morte em uma calçada podre de suja em frente a um dos lugares que mais frequentei quando adolescente. Ao menos poderia esperar relembrando todas as aventuras que tive e presenciei na minha passada vida de groupie. Foram tantos momentos divertidos e satisfatórios. Perdi quase todo o tipo de virgindade naquele lugar, mas parti para Portugal com a pureza de uma criança. A ilusão é predominante na infância, faz com que elas pensem que tudo é perfeito, tudo flui a favor delas, mas é tudo mentira. E foi assim, iludida, que fugi do que pretendia me fazer bem.
Apesar das perdas e dificuldade que tive enquanto morei com meu pai, dos dois aos dezessete anos, minha vida era prazerosa. Se eu realmente quisesse algo, batalhava por isso. Mas todos têm defeitos, e por mais que dissessem que eu era a garota ideal, tinha meu lado negativo. Orgulhosa, imatura e ignorante. Isso não me prejudicava, só fazia mal a quem estava querendo se aproximar de mim. Odiava que as pessoas se interessassem por mim, para fazer amizade, se eu quisesse, eu faria. Sei que magoei muita gente, mas só concluí isso, após ser magoada por um maldito ilusionista.
Pois é, eu e meus dezessete anos, recém-completos, queriam festejar, mas conheci Sebastião. No início, era tudo o que eu queria, fazia qualquer coisa pelo seu amor, até fugiria de casa. E fiz isso, fui para Portugal com ele, que me prometeu muitas coisas, e eu iludida, o segui. O que o desgraçado realmente queria era viver às minhas custas. Me torturou, me obrigou a vender coisas ilícitas, para uma menor de idade. Vendi drogas, vendi rins e órgãos variados, e vendi meu bem mais precioso, o corpo. A virgindade que eu não perdi no Opera1 em Curitiba, eu perdi em Lisboa. Seria melhor perder isso, do que a vida completa.
Sebastião era membro de uma gangue, quase máfia, que trazia garotas do Brasil para Portugal, dizendo que teriam muitas coisas, todos aqueles sonhos juvenis. Mas na verdade, elas eram escravizadas. E eu, iludida, fui umas das primeiras vítimas dessa armação

Não entendo como consegui ficar tanto tempo refletindo sobre meu passado sombrio e vergonhoso, pois achei que logo teria um ataque causado pelos remédios. Ou, não sei, vomitaria pelo excesso de cachaça. Despertei para conferir se me restava algum comprimido, ou qualquer coisa que me matasse. Mas um fato me assustou.

Um comentário:

  1. ótimo, nem sei dizer e essa versão foi melhor. Porque para um cara escrever né? ! HAHA parabeens!

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