Onisciente é aquele que não precisa descobrir coisas novas, que não quer saber mais, pois tem ciência de tudo.
Alberto não pretendia nem precisava ter onisciência do mundo, precisava apenas conhecer mais e mais sua mulher, suas carências e felicidades. Para isso, era necessário estar com ela, conhecê-la e precisar dela, mais.
Tudo era meio confuso. Alberto havia deitado em sua cama vazia há algum tempo, e pra dormir era preciso ficar vagando por inúmeros pensamentos, planos e teorias. Ainda mais quando sua mulher estava longe: dormindo na casa de sua mãe, de onde não podia dormir fora até adquirir poder e independência para morar sozinha ou com Alberto.
Para Alberto, desde o início, aquela relação surgiu diferentemente das outras: malditas ilusões, relações não-recíprocas. Para Alice, no começo, parecia diferente mas, mesmo assim, ela temia que fosse apenas mais um grande erro. Para alegria de ambos; além de ser real, era recíproco e sincero.
Ele fez de tudo para provar que não estava enganando a si mesmo. Ele batalhou para convencê-la de que ele era o cara certo; aquele que a faria bem, que estaria ao seu lado em qualquer momento. Angústia, tristeza, raiva, alegria, sonho, sono. Ele precisava que fosse recíproco.
Ela exigia mais convicção de si mesma. Ela lutou contra seus traumas e pesadelos para estar certa de que ele era quem ela queria mesmo. Ela precisava de um abrigo, que a confortasse nas tempestades indesejáveis de coisas desagradáveis. Ela exigia que fosse recíproco.
Eles queriam mais. Overdoses, risos, sorrisos, abraços, carinhos, consolos, conforto, certeza, reciprocidade. Eles queriam, podiam e precisavam de mais.
Sem sono e sozinho, Alberto gostava de deitar-se para poder: arquitetar novas maneiras de conquistar sua mulher, pensar nas alternativas que tinha pra vivências futuras, refletir sobre o que fez de bom ou mau pra si e sua mulher, e para tentar entender o que estava vivendo. Era uma chuva em sua mente; palavras, fatos, atos, fotos, frases, certezas, medos etc.
Era um tormento para Alberto tentar dormir sem Alice, sabendo que ela está longe. Mas era só ele olhar pela janela, avistar a Lua e relembrar que eles não estão tão distantes. Estavam sobre o mesmo céu. Sobre o mesmo luar, que os fazia sorrir e lembrar das noites de lua cheia e céu estrelado que passaram juntos.
Ainda eram crianças. Ainda não tinham o poder de fazer tudo, tudo, o que desejassem. Ainda eram subordinados à seus pais. Ainda tinham medo da sair da casa de seus pais. Embora almejassem muito a liberdade de estarem juntos, morarem juntos. Ambos, porém, temiam que a rotina de um casal que mora sob o mesmo teto pudesse destruir o sentimento que os mantia juntos; que o convívio exagerado pudesse fazê-los enjoar, enojar, um do outro. Mas eles adorariam conviver, dormir na mesma cama, dividir o mesmo quarto etc.
O mundo e seus habitantes planejam muitos conluios para separar pessoas. Alice e Alberto sabiam disso. E faziam de tudo para que as armações do universo não os derrubasse, não os distanciasse. E se algo os derrubasse, seria por vontade deles mesmos.
Quando uma pessoa tem uma vontade incontrolável ela pode fazer coisas erradas. Se essa pessoa tem vontade de ter outra pessoa, ela encarna seus instintos primitivos e apela ao indesejável para conquistar, mesmo sem consentimento, a outra. Alberto tinha medo de que algum ameba (sem ofensa aos micro parasitas) abusasse de Alice, por ela ser tão pequena. Aliás, essa grande qualidade, a altura, o fazia sentir-se obrigado a abrigá-la em seus braços.
Pois é, Alberto viajava intensamente em seus pensamentos pré-sono. Muito do que pensava, e do que dizia às paredes, não tinha coesão nem coerência. Ao se desentender consigo mesmo, ria sozinho de sua loucura. Que em partes, era proporcionada pela grande felicidade que Alice o fazia sentir.
Desde o início, ele disse para Alice e ao mundo que aquele sentimento não parecia real, que parecia um sonho. Mas ele não queria que fosse um sonho. Queria acreditar cada vez mais no ditado “tem louco pra tudo”. Ele era incapaz, antes de Alice surgir em sua vida, de acreditar que encontraria alguém decente que fosse capaz de fazê-lo bem, de fazê-lo acreditar que sonhar não era em vão.
Antes de Alice, em seus tempos obscuros, ele insistia em gritar pra si mesmo que deveria acreditar que haveria alguém e , quando surgisse, batalharia por esse alguém, caso tivesse certeza.
E, depois da morte, Alice é a maior certeza que Alberto tem.
O que há com Alberto para ele não querer outra? O que há com ele para precisar tanto dessa pequena? O que há com Alice para querer tanto viver com Alberto? O que há com ela para querer realizar seus sonhos com ele? O que há...?
Ora, eu, mero narrador, não sei nem quero saber, não é meu assunto. Eles que se virem pra descobrir. Isso se eles quiserem. Ficar pensando muito no que os faz ficarem juntos é desperdiçar o tempo que podem gastar vivendo.
Alberto gostava de ficar viajando. Mas preferia, sempre, estar com sua mulher. Já que isso não era possível ele viajava. Mas dizia pras paredes e pra si mesmo: Minha cama está vazia mas é por pouco tempo. Minha vida está cheia de Alice e é pra sempre.
Enfim, ele dormiu. Não sonhou.
Afinal, pra que sonhar enquanto dorme se ao acordar ele viverá tudo aquilo que sonhou antes de conhecer sua mulher?
“Bom dia...” O despertador tocou, Alberto despertou, sorriu e cantou mentalmente:
-“É um ótimo dia para estar vivo, é como se eu pudesse respirar pela primeira vez. Estou realmente vivo”
Ele tinha ciência que, ao despertar, sua mulher diria o mesmo e “wish you were here...”
Está na hora de alguem visitar minha oficina de criação literária. Mas antes, deve-se pensar em comprar uma boa gramática.
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