Ao contrário da maioria dos irmãos mais velhos, Diego não
sentia ciúmes, nem ódio, de Filipe. Eram parceiros, um sempre defendia os
outros, qualquer fosse a situação. Muitas vezes, Filipe argumentou a favor de
seu irmão velho sem saber o que realmente havia acontecido. E, inúmeras vezes,
um se pôs no lugar do outro para receber um castigo. Filipe era um caçula
corajoso e sem vergonha. Diego, três anos mais velho, tentava, ao máximo,
demonstrar sua maturidade.
Na adolescência, a amizade se fortalecia cada vez mais,
quando um chorava pro outro suas paixões de escola. Conversavam sobre tudo.
Quando necessário Diego reprimia Filipe sobre alguma coisa. Vice-versa.
Aí surgiram as namoradas. Pelo menos, as de Diego. O caçula
era arteiro demais pra se prender a uma garota. Já o mais velha, possuía um
romantismo inigualável e supervalorizava qualquer beijo.
Aos vinte e dois, Diego conheceu Magda, a garota dos seus
sonhos. Era um romance digno de apreciação. Filipe adorava ouvir as histórias
que seu irmão tinha pra contar sobre sua donzela. Não havia distúrbios nesse
caso, estava indo tudo muito bem.
Até que um dia Diego se cansou de Magda e, sem razões
concretas, pediu que ela se retirasse de sua vida. Magda não entendera, mas
respeitou, pois o amava demais. Filipe não quis se meter, por mais indignado
que estivesse com seu irmão.
Era visível que Diego estava abalado com tudo isso, mas
estava seguindo em frente. Enfim, seu caçula decidiu questionar o porquê do
término, e foi fria a resposta de Diego:
-Cansei dela e de todo esse conto de fadas que estávamos
vivendo. Era certo que algum dia apareceria um dragão ou bruxa pra destruir
tudo. Era previsível, era tudo perfeito demais. Então, decidi poupar dores.
- Mas, cara, a Magda te ama. Você não podia ter feito isso!
- Quer cuidar dela? Vá, fique com ela.
-Tá louco? Nunca. Você tá errado, mano, muito errado.
As expressões de Diego estavam cada vez mais sombrias. E os
passeios solitários, cada vez mais longos. Filipe estava preocupado.
Diego, louco da cabeça, aparecia com uma garota nova a cada
semana.
Um mês, quase dois, depois, Filipe, então, decidira empurrar
Diego na parede:
- Cara, o que você tem na cabeça?
- Que foi?
- Você tem problema? Você é tão esperto e inteligente e
romântico. Essas gurias não passam de interesseira$.
- Não fala assim delas, eu quero isso tudo! - a voz de Diego
se elevara.
-Não, não quer. Magda é sua verdadeira mulher. Ela sim te
merece.
- Magda já era.
- Já era mesmo. Conversei com ela ontem, contei tudo. Só ela
é capaz de te entender, mas, depois de tudo isso, ela está abalada demais pra
tentar te ajudar. Ela te ama muito ainda, e, acima de tudo, te respeita pra
caramba. Você devia, no mínimo, dar uma explicação a ela, pois, até agora, ela
não teve nenhuma.
- Não mete na minha vida, seu piá de merda. Se eu larguei
Magda, foi porque eu quis. Tenho que explicar porra nenhuma pra ninguém, nem
pra você.
- Diego, para de ser idiota. O que essas bonecas têm? No que
elas superam a Mag?
- Sexo...
- E só isso? Que mais?
- Isso basta.
- Aham, claro... E se um dia você precisar de colo? Se um
dia você precisar ouvir palavras reconfortantes? E se um dia eu e nossos pais
morrermos, quem cuidaria de você? Uma ninfomaníaca? Acho que não... Se
continuar assim, pode me esquecer.
- Cara, eu estava cansando da Mag. Ela me amava demais e eu
não aguentava mais isso!
- Ela ficava o dia todo no teu pé?
- Não...
- O que ela fazia de errado então?
- Sei lá, ela se preocupava demais comigo. Queria saber se
eu estava bem a qualquer momento. Perguntava-me se podia me ajudar a todo
instante. Não quero saber disso.
- Então pra quê você quer uma mulher? Só pra cama? Só isso?
Pra isso existem bonecas infláveis e sites pornô. Para essa e outras coisas
existe uma mulher de verdade a sua espera. Que não está nem aí pra essa sua
decisão idiota. Volta pra Mag, por favor.
- Não quero uma segunda mãe.
- Tá, e se a nossa mãe morrer amanhã? A Mag estará pronta
pra cuidar de ti. Eu não. Você largou a
namorada perfeita pra pegar piriguetis que dizem “me empresta dinheiro pra mim
ir lá”... Você é estranho, cara.
- Me deixa.
-Não deixo. Você está inseguro? Você sente que está te
faltando algo?
- Cansei de ser casal. Quero ser louco.
-Você pode ser louco quando quiser, mesmo namorando. E, com
certeza, do jeito que a Magda te ama, ela te apoiara em qualquer loucura.
- Eu quero experiências.
- A Mag nunca te impediu de nada.
- Quero outras.
- Cara, um dia, uma mina dessas vai se apaixonar por você,
entre aspas. E vai ficar obcecada por você. Aí você não vai querer e vai magoar
mais uma garota. Você tá pegando essas gurias pra tentar esquecer a Mag. Você
nunca conseguirá. Por mais surubas que você faça. O que vocês dois viveram é...
algo invejável. Milhões fariam o impossível pra viver o que você viveu com a
Mag. E você está simplesmente... jogando fora.
- Cansei disso tudo. Não quero ser especial.
- Quer ser só mais um jogado nos bares a procura de uma
paquera one night only? Ou um bicho
assexuado isolado de tudo?
- Quero ser o que eu quiser. Quando eu bem entender.
- Cara, calado. Seus argumentos se acabaram logo que você
largou a Mag. Não seja estúpido em continuar com isso tudo.
Diego realmente precisava desse sermão.
Alguns dias depois, ao se levantar, em seu aniversário,
Filipe recebe um dos melhores presentes de sua vida: Diego e Mag juntos
novamente.
Filipe sabia que seu irmão tinha a necessidade de ter alguém
pra chamar de “minha mulher”.
Filipe era o oposto, conseguia e gostava de viver sozinho.
Porém, as pessoas são diferentes. Alguns tentam amar, outros
conseguem; outros não querem; outros fingem.
Talvez, seja errado se meter nas vidas alheias. Porém, é
necessário quando a vida de alguém amado está em jogo. Filipe amava cuidar de
seu irmão confuso. Diego era parte de sua vida, então, era certo que seu irmão tentasse mudar algo.