Parte II
Era domingo de manhã e ele não queria levantar, mas sabia que a reunião seria necessária se realmente quisesse filmar seu roteiro. Aliás, Lu estaria lá.
O fato de não ter dormido em casa, ou seja, estar deitado em um sofá de dois lugares na casa da amiga o ajudou a juntar forças para levantar. Jules, a dona do lugar, entrou na sala gritando:
- Acorda, cachorro! Chama as meninas!
- Ô - sentou-se todo mole - por que você foi arranjar esse encontro pra dormindo de manhã?
- Dormindo de manhã tá você, bêbado. Ressaca?
- Nada, é que minha religião não permite acordar domingo cedo e, como punição sagrada, ficamos com sono e falando coisas erradas até o meio-dia.
Os dois já estavam na cozinha.
- Café?
- Não, credo, hoje é um dia que não posso ter crises de ansiedade. Cadê a Rê?
- Tá no banheiro.
- Mas se quiser me fazer aquele teu suco de abacaxi, eu aceito.
Foi ao encontro de Rê, outra melhor amiga, que também estava envolvida nos tais negócios cinematográficos. Ela, escovando os dentes, disse:
- Caiu da cama?
- Não, Jules me acordou. Mas ei, certeza que a Lu vai mesmo?
- Sim, foi ela que esquematizou tudo e me disse que faria questão de estar lá.
Rê e Jules caminhavam pouco a frente enquanto Lu e Agá tinham parado em frente a uma loja, mas logo seguiram viagem. As mãos dele estavam soltas, principalmente a direita que estava mais próxima de Lu, que, com sua esquerda, segurava sua bolsa. Então as duas mãos se trombaram e os dedos dela puxaram os dele e, aos poucos, lentamente, começaram a andar de mãos dadas.
- Olha que fofos aqueles dois - disse Jules para Rê, que respondeu:
- Cada um olhando prum lado sorrindo, que amor…
- Mas será que ela é bi?
- Eu tentei ficar com ela… não rolou, mas não sei.
- Que seja, olha a cara do Agá - ele encarava Lu com o canto do olho e soltava um sorriso tímido, enquanto acariciava com seus dedos a mão dela. O dedão da moça estava escondido entre as mãos como se ali fosse seu ninho.
Calçadão entre a Tiradentes e a Generoso Marques parecia ter muito mais que apenas 200 metros, pois os dois estavam caminhando ali há certo tempo sem a menor pressa. A caminhada foi e voltou por calçadões e galerias do Centro, chegando a passar pelas mesmas ruas mais de uma vez. Acabaram entrando em um sebo aleatório. Brincaram com capas de discos estampadas com rostos e foram a um corredor, onde Lu disse que procuraria um livro com uma frase que, segundo ela, era a cara dele. Procurou, procurou, Agá parecia não estar entediado ao vê-la procurar o tal livro, até que Lu pegou um, pigarreou como um padrinho de casamento prestes a fazer um discurso aos recém-casados:
- “Que é que você vai fazer em Gallois?”
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