2015/11/18

A culpa ou O souvenir

“Você precisa superar essa mulher e procurar outra melhor pra você.”
“Você precisa superar essa mulher e procurar outra melhor pra
“Você precisa superar essa mulher e procurar outra melhor
“Você precisa superar essa mulher e procurar outra
“Você precisa superar essa mulher e procurar
“Você precisa superar essa mulher e
“Você precisa superar essa mulher
“Você precisa superar essa
“Você precisa superar
“Você precisa
“Você
“Você precisa
“Você precisa continuar
“Você precisa continuar insistindo
“Você precisa continuar insistindo e
“Você precisa continuar insistindo e ignorar
“Você precisa continuar insistindo e ignorar qualquer
“Você precisa continuar insistindo e ignorar qualquer outra
“Você precisa continuar insistindo e ignorar qualquer outra mulher.”


O desejo tal qual uma faca cega distorcia todos os conselhos que tentavam jogar em sua cabeça. Ignorava as coisas que lhe diziam sobre o quanto certo “relacionamento” - que não passava de um flerte platônico romantizado que durou anos - como se fossem emails de aumento peniano.
Questionava-se se o amor de M. não era suficientemente forte para tirá-lo do poço de C. A resposta, a qual ele se recusou a enxergar, era que não havia maneira possível de mensurar o quanto uma pessoa ama outra e esquematizar gráficos comparativos com o sentimento por uma terceira. Sua mania de transformar tudo e todo mundo em número não era prática quando se tratava de relacionamentos. Meses depois do desfecho, melhor dizendo, perda de contato, após se abrir para poucas amizades sobre tudo, entendeu que o que mais prejudicou seu relacionamento com O. não foi a falta - ou excesso - de amor, mas o fato de não ter conseguido superar nem esquecer C., que invadiu seu peito poucos meses antes da chegada daquela que o aceitava como ele era, sem que ele criasse personagem algum. Nessa corrida sem vencedores, as duas mulheres já subiram ao pódio pegar suas medalhas de participação, e ele ainda está a muitas voltas de cruzar a linha final, que separa a saudade, o desejo, de uma vida nova.
Depois de um tempo, depois que os dois pássaros deixaram sua mão, se é que algum dia chegaram a repousar ali, e foram voar longe, a frustração, que parecia distante, na verdade, foi uma maré que recuou bastante, deixou a praia seca, cheia de areia e saudade, e voltou com tudo, avassaladora, trazendo todas as epifanias que ele não teve em época mais apropriada.
Agora, sozinha, restava o único souvenir que conseguiu manter antes de queimar tudo ao seu redor, a lembrança de um tempo em que ele podia repousar num sofá, num banco - de praça ou ônibus - e olhar para o lado, e sentir-se tranquilo e compreendido.
O desfecho decente que ele queria e precisava talvez nunca se concretize, mas temia que O. tivesse enfim superado o que viveu com ele, mas, mesmo assim, um novo contato poderia servir para desencadear uma nova avalanche de tristeza. Ele não queria vê-la assim, mas não conseguia mais reter a culpa e não suportaria saber que, em alguma realidade paralela, ela leria seu pedido de desculpas e responderia a fim de um recomeço.

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