A liberdade de falar o que quisessem era bastante ampla, mas
um assunto era censurado pelos dois: os dois. A viabilidade de que existisse o
termo “nós” entre eles não entrava em pauta nos extensos diálogos.
As pessoas diziam que os dois eram namorados exemplares no
sentido de serem livres e independentes. Era admirável que eles não
demonstrassem serem namorados, que eles conseguissem não andar colados o tempo
todo, mas todos não sabiam de toda a verdade. Todos estavam errados. O que era livre e saudável era a amizade
entre ambos, eles se davam muito bem e não havia impedimentos para serem sinceros
e reais um com o outro. Mas o tal namoro aparente almejado pela audiência era inexistente.
Se fossem oniscientes, saberiam que eram reciprocamente
apaixonados, mas preferiam esperar que a outra parte dessa relação se
pronunciasse. Ambos morreriam na praia se continuassem assim afogados em
vontade.
Ele era todo pragmático e ensaiava métodos para expor o que
queria (os lábios dela, mas que a liberdade entre os dois se mantivesse): Ficar
bêbado junto com ela e aproveitar a espontaneidade para falar a verdade; escrever
uma poesia e colar no ponto de ônibus onde ela passava diariamente; aproveitar
um abraço de despedida e emendar um beijo ou escrever um conto imaginário que
ninguém fosse ler confessando tudo para ela.
Ela era toda silenciosa para expor suas intenções com qualquer
pessoa. Confabulava sinais que ele pudesse entender: Aproveitar brechas alcoólicas para explanar sobre o quão compatíveis eles são (por mais que discordassem em muito, entendiam-se e aceitavam as
diferenças); aproveitar um diálogo sobre romances para dizer (enquanto mirava a
luz da rua e acariciava seu próprio cabelo) que queria se apaixonar; pronunciar
a ele que almejava a felicidade do amigo com quem quer que fosse a garota que
estivesse no coração dele ou contar sobre os caras que conhecia na vida só pra que ele se
sentisse provocado.
Ele iniciara o ano sem metas, numa vibe pessimista, mas com
o passar dos meses prometeu a si mesmo que na próxima festa de réveillon diria:
“Esse ano, não encontrei a mulher pra me fazer bem, mas tive coragem pra chegar
naquela que conheço há tempos e dizer que era ela quem me fazia um homem
melhor, por mais que eu tenha demorado quase cinco anos pra dizer isso.”
Ela dizia que queria se apaixonar em 2013, que cansara de
tantos casos, mas descobriu que já estava apaixonada há tempos. Fossem pelas frases
disléxicas, pelos sonhos megalomaníacos ou pelo sorriso tímido, ela estava
encantada por ele.
Eles não sabiam como dizer, nem se deviam. Era um risco a
ser tomado. Dizer tudo e (1) inaugurar um romance ou (2) arruinar uma amizade.
Eles tinham medo. Ah, se eles soubessem que queriam a mesma coisa, tudo seria
mais fácil, mas não haveria a sensação de conquista se a dificuldade em soltar
a verdade não existisse. O alívio da confissão e a permissão pare serem mais
livres entre si era algo que os motivava a tentar falar. Mas, por mais que
falassem sobre tudo, eles não sabiam como dizer.
Ele não se preocupava mais em esconder o encanto que sentia por ela. Ela não se importava em ocultar que a presença dele era precisa. Estava tudo muito explícito, exceto as palavras.
Não era paixão, não era amor. Nada seria enquanto ficassem calados.
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