2014/12/11

Não me mata

Primeira coisa que fiz ao terminar de ler a carta foi pensar no que acontece depois que ele me mata toda vez que assiste (ou assistimos, mesmo que não estejamos juntos) um romance trágico. Poderia perguntar pra ele mesmo, que me entregou a folha sem vontade. Preferi ler em casa e foi melhor: pude desabar no meu colchão. Nem era grande coisa, o texto, mas sei que, se ele se deu ao empenho de escrever a mão e me entregar pessoalmente, era big deal. Esse era um dos encantos nisso que vivemos, apesar da distância atual: a grandeza de coisas simples. De encontros em bancos de praça a despedidas tímidas e ligeiras.
Ele disse que me mata antes do filme de filmes trágicos, mas, se ele faz isso pra evitar minha dor, o que acontece com ele depois? Ele fica sozinho, chorando, sofrendo? Quem é que abraça sua dor? Eu não queria que ele ficasse assim, mesmo que por causa de um filme. Muito menos por minha causa. Eu poderia estar ao lado dele, chorando, sofrendo. Viva.
Pensei em responder a carta, pensei, pensei, demorei. Não tive como retribuir, responder em palavras. Passou-se um tempo, muitos dias, meses, e ainda não havia dado algum sinal de vida pra ele. Talvez eu estivesse mesmo morta. Ou ele, morto. A gente se perdeu. Queria ser reencontrada por ele. Mas eu teimo querer falar sobre sentimentos por ele com olhares, ao lado dele, num lugar qualquer. Dominávamos o "não saber tomar iniciativa", esperávamos pelo conflito de rotas. Durante a espera, passava eu, não sei ele, por outros planetas, camas, bares - porém, ainda na esperança de que ele também estivesse lá me puxasse pra perto dele.
Não sei afirmar se seu sentimento exagerado realmente me incomodava, apesar de não ser algo ruim em doses controladas, mas digo que ele não consegue disfarçar o quanto se joga nas coisas, e parece que gosta disso. De cabeça, sem capacete nem freio, ele vai, não para, até colidir contra o muro da utopia, cair no vulcão do platonismo, se afogar no mar morto da superficialidade... Universos de possibilidades frustradas, destroem-no antes do fim, durante e depois do fim.
Pode até me matar antes do fim, mas me mate também em sua mente, queime todo e qualquer vestígio de boas lembranças do que vivemos. Não quero ser mais uma de suas fantasma, o assombrando com o que não fomos, evocadas em rituais alcoólicos. 
Mentira, não me mata, não! Quero ficar aqui, lá, enfim.

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