2010/12/14

Admiração (Aquele Hermético Recíproco)

Alberto era, felizmente, o cara mais, despropositalmente, lindo e fofo do meu mundo. Diz coisas que, sem querer, são tão bonitas e cativantes. Qualquer garota amaria tê-lo ao seu lado dizendo aquelas graças mas esse privilégio era meu somente.
Sem dinheiro, disléxico, desempregado, tímido, calado, inteiramente meu; cheio de roupas sujas, velhas e rasgadas: esse é apenas um conjunto dentre 280000 definições daquele garoto tão...
Conhecê-mo-nos no dia treze de Abril. Segundo ele, já andava me observando há tempos; porém foi nesse dia que ele finalmente, felizmente, decidira se apresentar a mim. Pra quem não sabe, treze de Abril é o "dia do beijo".
Declarou seu amor platônico, sem sequer me tocar, focando meus olhos; expondo seus convincentes argumentos. E seus principais "defeitos": teimosia, orgulho, ser mimado, possessivo e "quando tem algo não larga desse algo até enjoar". Era lindo vê-lo gesticulando como se apossava de algo, puxando-o para si e apertando contra seu peito e dizendo: "eu quero, é meu, meu, só meu, não largo!". Esclareceu, também, que se o sentimento fosse recíproco ele não abandonaria o romance como quando enjoava de um brinquedo qualquer. A cada palavra solta por este garoto-poeta-tão-apaixonante eu me tornava cada vez mais confusa pois me estava vivendo um romance; conturbado era, confesso, mas era um romance. A cada palavra solta ele assassinava cada vez mais meu sentimento pelo outro rapaz. Ele matou um romance que não era dele e foi melhor pra nós. Como Alberto mesmo descreveu ser um "defeito" seu, foi teimoso até eu me tornar inteiramente sua. Defeito? Se não fosse por isso eu estaria, talvez, frustrada por ter continuado naquele romance que Alberto assassinou com a minha permissão; estaria, talvez, decepcionada por estar com alguém que não era pra mim. "A vida é feita de escolhas e eu não poderia ter escolhido caminho melhor que o teu," Alberto.
Ahr! E como eu sou feliz por ter ouvido aquele garoto tão, expressivamente, confuso, disléxico, convincente e, naquele dia, desconhecido. Ainda é um desconhecido, conheço-o pouco mais a cada dia que se passa desde que daquele dia 13 e quero morrer sem ter conhecido todo aquele ser hermético que chamo, com todo o prazer e toda a convicção, de "meu".
Ahr! Ele é tão folgado (óbvio, após ter conquistado toda confiança, liberdade, carinho, respeito e reciprocidade) ao ponto de não me chamar de "Alice", me chamar de "Ei,..." e prosseguir com o que quer dizer.
Ahr! Como eu adoro esse garoto brincalhão, que no dia treze de Abril disse que se fosse um daqueles caras galinhas, ao invés de ter se declarado sinceramente, teria dito "E aí, gata, tá a fim de comemorar o dia do beijo comigo?"
Ahr! Como era bom ter "liberdade pra poder falar sobre o que se sente e o que já foi sentido" não só entre nós mas no passado também, com outras pessoas. Alguns outros casais tem liberdade apenas sobre uma cama no escuro pra mostrar suas genitálias a(o) parceira(o). Liberdade é, além disso e muito mais, como conversar com espelho: dizer o que quiser sem ter vergonha, sem moderar as palavras. Mas, claro, com respeito.
Em treze de março eu queria acreditar que em algum lugar dessa cidade alguém procurava por mim, assim como eu procurava por alguém. Alguém que procurasse alguém para ser "a sua garota". Eu procurava reciprocidade, alguém para ser "o meu garoto". Pensava que o "garoto decente" apenas existisse nos romances de livraria ou naquelas fotos do Tumblr. Mas de onde viria a inspiração para criar esses romances e essas fotos? Da vida real! Mesmo que pareça utopia, encontrar o seu alguém decente, não é. Utopia é ganhar na mega-sena, é Os Simpsons, é implantar o Socialismo em nosso país; é descer do ônibus, em Curitiba, às seis da tarde sem ser atropelado por quem embarca.
Tem louco pra tudo! Por mais estranho(a) que você seja. Ele me fez acreditar nisso. É como ele mesmo diz: "Para se conquistar algo necessário é preciso 'Acreditar (nesse algo necessário) e Batalhar.'" Acredite e batalhe. Pode demorar três dias, três anos ou uma década, calma, tua hora vai chegar.
Alberto me fez acreditar nele e no amor e batalhar pela felicidade. Graças a nós, eu vivo e é recíproco.
Sem ele não há eu, sem eu não há ele.
Somos nós "ao infinito e além!"

2010/10/21

O que há...?

Onisciente é aquele que não precisa descobrir coisas novas, que não quer saber mais, pois tem ciência de tudo.
Alberto não pretendia nem precisava ter onisciência do mundo, precisava apenas conhecer mais e mais sua mulher, suas carências e felicidades. Para isso, era necessário estar com ela, conhecê-la e precisar dela, mais.
Tudo era meio confuso. Alberto havia deitado em sua cama vazia há algum tempo, e pra dormir era preciso ficar vagando por inúmeros pensamentos, planos e teorias. Ainda mais quando sua mulher estava longe: dormindo na casa de sua mãe, de onde não podia dormir fora até adquirir poder e independência para morar sozinha ou com Alberto.
Para Alberto, desde o início, aquela relação surgiu diferentemente das outras: malditas ilusões, relações não-recíprocas. Para Alice, no começo, parecia diferente mas, mesmo assim, ela temia que fosse apenas mais um grande erro. Para alegria de ambos; além de ser real, era recíproco e sincero.
Ele fez de tudo para provar que não estava enganando a si mesmo. Ele batalhou para convencê-la de que ele era o cara certo; aquele que a faria bem, que estaria ao seu lado em qualquer momento. Angústia, tristeza, raiva, alegria, sonho, sono. Ele precisava que fosse recíproco.
Ela exigia mais convicção de si mesma. Ela lutou contra seus traumas e pesadelos para estar certa de que ele era quem ela queria mesmo. Ela precisava de um abrigo, que a confortasse nas tempestades indesejáveis de coisas desagradáveis. Ela exigia que fosse recíproco.
Eles queriam mais. Overdoses, risos, sorrisos, abraços, carinhos, consolos, conforto, certeza, reciprocidade. Eles queriam, podiam e precisavam de mais.
Sem sono e sozinho, Alberto gostava de deitar-se para poder: arquitetar novas maneiras de conquistar sua mulher, pensar nas alternativas que tinha pra vivências futuras, refletir sobre o que fez de bom ou mau pra si e sua mulher, e para tentar entender o que estava vivendo. Era uma chuva em sua mente; palavras, fatos, atos, fotos, frases, certezas, medos etc.
Era um tormento para Alberto tentar dormir sem Alice, sabendo que ela está longe. Mas era só ele olhar pela janela, avistar a Lua e relembrar que eles não estão tão distantes. Estavam sobre o mesmo céu. Sobre o mesmo luar, que os fazia sorrir e lembrar das noites de lua cheia e céu estrelado que passaram juntos.
Ainda eram crianças. Ainda não tinham o poder de fazer tudo, tudo, o que desejassem. Ainda eram subordinados à seus pais. Ainda tinham medo da sair da casa de seus pais. Embora almejassem muito a liberdade de estarem juntos, morarem juntos. Ambos, porém, temiam que a rotina de um casal que mora sob o mesmo teto pudesse destruir o sentimento que os mantia juntos; que o convívio exagerado pudesse fazê-los enjoar, enojar, um do outro. Mas eles adorariam conviver, dormir na mesma cama, dividir o mesmo quarto etc.
O mundo e seus habitantes planejam muitos conluios para separar pessoas. Alice e Alberto sabiam disso. E faziam de tudo para que as armações do universo não os derrubasse, não os distanciasse. E se algo os derrubasse, seria por vontade deles mesmos.
Quando uma pessoa tem uma vontade incontrolável ela pode fazer coisas erradas. Se essa pessoa tem vontade de ter outra pessoa, ela encarna seus instintos primitivos e apela ao indesejável para conquistar, mesmo sem consentimento, a outra. Alberto tinha medo de que algum ameba (sem ofensa aos micro parasitas) abusasse de Alice, por ela ser tão pequena. Aliás, essa grande qualidade, a altura, o fazia sentir-se obrigado a abrigá-la em seus braços.
Pois é, Alberto viajava intensamente em seus pensamentos pré-sono. Muito do que pensava, e do que dizia às paredes, não tinha coesão nem coerência. Ao se desentender consigo mesmo, ria sozinho de sua loucura. Que em partes, era proporcionada pela grande felicidade que Alice o fazia sentir.
Desde o início, ele disse para Alice e ao mundo que aquele sentimento não parecia real, que parecia um sonho. Mas ele não queria que fosse um sonho. Queria acreditar cada vez mais no ditado “tem louco pra tudo”. Ele era incapaz, antes de Alice surgir em sua vida, de acreditar que encontraria alguém decente que fosse capaz de fazê-lo bem, de fazê-lo acreditar que sonhar não era em vão.
Antes de Alice, em seus tempos obscuros, ele insistia em gritar pra si mesmo que deveria acreditar que haveria alguém e , quando surgisse, batalharia por esse alguém, caso tivesse certeza.
E, depois da morte, Alice é a maior certeza que Alberto tem.
O que há com Alberto para ele não querer outra? O que há com ele para precisar tanto dessa pequena? O que há com Alice para querer tanto viver com Alberto? O que há com ela para querer realizar seus sonhos com ele? O que há...?
Ora, eu, mero narrador, não sei nem quero saber, não é meu assunto. Eles que se virem pra descobrir. Isso se eles quiserem. Ficar pensando muito no que os faz ficarem juntos é desperdiçar o tempo que podem gastar vivendo.
Alberto gostava de ficar viajando. Mas preferia, sempre, estar com sua mulher. Já que isso não era possível ele viajava. Mas dizia pras paredes e pra si mesmo: Minha cama está vazia mas é por pouco tempo. Minha vida está cheia de Alice e é pra sempre.
Enfim, ele dormiu. Não sonhou.
Afinal, pra que sonhar enquanto dorme se ao acordar ele viverá tudo aquilo que sonhou antes de conhecer sua mulher?
“Bom dia...” O despertador tocou, Alberto despertou, sorriu e cantou mentalmente:
-“É um ótimo dia para estar vivo, é como se eu pudesse respirar pela primeira vez. Estou realmente vivo”
Ele tinha ciência que, ao despertar, sua mulher diria o mesmo e “wish you were here...”

2010/09/30

Concretismo

GADRO, GADRO...

resolvi experimentar uma desconhecida DROGA
mesmo antes usando OUTRAs
não passaram DE ilusões destruidoras
foi PRECISO coragem para
NÃO dar espaço à dor




Bagunçado Concretista Poema Primeiro 5X5

Estar Longe Do Que Preciso
E com que saudade aguento
Gostar de você eu quero
Só você precisa é poder
Necessidade fome tenho de tudo

2010/08/02

Depoimento de um viciado (Microconto psicológico)

Aqueles beijos de vinho e o extremo conforto me deixam mais doente, mais viciado, mais louco por você. O que faço?
Estou tão viciado que, no momento, em nosso caso, me contentaria muito em ficar com você em qualquer lugar, onde quer que fosse, com quem quer que fosse.
Liguei o foda-se, quero você e ponto.
Eu sei que eu tenho você. Acho até que é a única coisa (respeito! coisa não, é pessoa! a unica pessoa) que eu realmente tenho. Mas eu quero te ver, te abraçar, te ter, quando a vontade surgir.
Sabe, estou ali, de repente quero te ter e é só eu ir até você. Entende?
Estou de "bad", e ficarei até o próximo encontro.
Quando o carro foi indo, eu sorri, e geralmente eu sorrio porque não consigo chorar.
Eu sei, eu sei. Só não sei porque temos que estar distantes agora, não entendo, não aceito. Ó, entendi, malditas táticas do vício! Temos que estar distantes agora para que num futuro não tão distante possamos nos manter juntos. Eu estudo, você encontra um emprego que dê pra sobreviver e seremos felizes em algum lugar. Não sei porque estudamos, vou morrer mesmo. É tão desnecessário, né?
Ó, malditas táticas do vício!
Não preciso estudar pra me sustentar através dos meus livros. Alias, pensando bem, nao sei porque estudo. Ah, estudo a vida.
I Want You. I Want You.
Quero crescer contigo. Quando eu crescer: quero ser o teu homem, quero ser o homem da tua vida. Convicção é meu sobrenome do meio.
Smother me, smother me...
Eu quero, quero muito. E nós temos uma vida pra isso. Logo estaremos juntos e eu vou te sufocar de tanto abraço, beijo e amor que te darei.
Smother me, smother me...
Você me apresentou tantos sentimentos, tantas emoções que eu muito faço pra retribuir. Aliás, você me faz acreditar em algo que eu desacreditava, amor.

2010/07/07

O seguidor - Exclusivamente particular

"...just hold me tight.
Lay by my side
and let me be the one..."
The Used - Smother me



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-Bonita sua namorada. Alias, acho que a conheço de algum lugar.
-...Ah, ela me disse que vocês já ficaram.
-Não, sai fora, sou hetero!
- Tô de brinques!


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-Oi, Alice. O que faremos no sábado a noite?
-Oi. Puts, não sei. Alguma ideia?
-Sim, um pessoal me chamou para uma outra festa. Estou afim, vamos?
-Uau, pode ser... Te ligo depois, vou entrar na aula agora. Beijo, Alberto.



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 A rotina era o unico problema no relacionamento de Alberto e Alice. Ainda mais para ele, que estava estudando intensamente, em ano de pré-vestibular. Ela, apesar de ser mais nova que ele, já era universitária. A unica preocupação da família dele, era que ela pudesse atrapalhar seus estudos, mas ele não teve culpa de conhecer a garota no mesmo ano de vestibular. Eram suas duas únicas prioridades, externamente, a principal era o vestibular, mas internamente, ela dominava seu ser.
No meio de semana, eles se encontravam poucas vezes, por pouco tempo, pela rotina de estudos que ambos seguiam. O fim de semana era intenso, overdose. Exceto pelo sábado a tarde, quando ele tinha aulas de revisão. Mas depois da aula, era Alice até a madrugada de segunda, quando ele a trocava pela rotina.
Geralmente, eles ficavam pelo centro da cidade, bebendo, conversando e observando as pessoas e o céu. Raramente, eles iam a alguma festa, bar ou show. 
Não era a intenção de Alberto fazer amigos no Cursinho, mas a necessidade de comunicação e distração o aproximaram de algumas pessoas. Ali ele tinha poucos amigos, como sempre foi. E como sempre ele se aproximava de pessoas com gostos e interesses semelhantes. Num dia qualquer, uma amiga o convidou para uma festa. Ele foi, junto com Alice. Lá, eles ficaram isolados do povo. Na segunda-feira, seus colegas comentaram sobre sua garota. "-Que bonito vocês dois no canto, conversando." "- Vocês combinam.".".. acho que a conheço...". Na mesma semana, a mesma amiga o convidou para outra festa. No mesmo dia ele informou Alice sobre a festa. Depois de mais uma semana cansativa, o sábado chegou.
Já era de praxe Alice esperar Alberto na saída de sua aula. Desta vez, o casal precisava esperar uma galera para irem juntos à festa.
 O Colégio foi o ponto-de-encontro da galera. Enquanto alguns ainda não chegavam, Bertô apresentava Lice aos colegas.

Era a segunda semana em que eles iriam a um festa cujo organizador é colega de Alberto. Na semana passada, eles foram numa junina feita por Norah. Em qualquer festa, Alberto e Alice preferiam ficar isolados, no canto, conversando, tanto que ninguém a conhecia e ele não teve a capacidade de apresentá-la   aos seus colegas.
Na segunda-feira, fora novamente convidado para outra festa, e Norah,que estava na festa passada, comentou para Alberto que acreditava conhecer Alice de algum lugar.
Enquanto o povo restante não chegava, Norah comentou:
- Alice, esse teu namorado é um palhaço! Disse pra ele que você era muito bonita e que achei que te conhecia de algum lugar,-Alberto encarou Norah como se a ordenasse parar de falar- e ele bem assim: "Ah, ela me disse que vocês já ficaram.", mas tipo, eu ri, porque eu sou hétero e tenho nojo de lésbicas.

O que ninguém, além de Alberto, sabia era que Alice fora fortemente apaixonada por uma garota, antes de conhecê-lo. E ele foi o responsável por fazê-la esquecer aquele maldito platonismo corrosivo. E Alice odiava citações homossexuais. Ela tinha péssimas lembranças do tempo de ilusão e auto-mutilação. Ela não podia ouvir qualquer coisa relacionando seu nome ao homossexualismo
Alberto dizia muitas coisas sem pensar, sem querer ofender, mas algumas vezes magova alguém, e se arrependia depois. Ele tentava controlar essa patologia, mas era do subconsciente, era impulso, era desproposital. Alice sabia disso, desde o início tentou viver com essa doença dele. Mas às vezes ele se superava, e ela se machucava. Foi o que aconteceu neste sábado.

Alberto estava sem reação após ouvir Norah. Ele não achou que sua colega contaria sobre sua brincadeira da segunda-feira. Ele não imaginava que Alice saberia da brincadeira.
Norah percebeu que havia feito cagada, e se calou.
Alice preferiu pensar, calada, numa reação, que não piorasse ainda mais sua situação, e de Alberto. Ele errou, mas não era por isso que ela deveria agir inconscientemente e errar por vingança. Sua opção foi virar as costas e começar a andar, calada, sozinha, em direção a sua casa.
Alberto também preferiu pensar; entre ficar ali e correr atrás, preferiu seguir Alice. Antes, encarou Norah e a mandou à merda. Então, ele correu.

Albertou correu até Alice. Ela apressou o passo, ele imitou. Ela estava indo pra casa, ele iria onde fosse para se explicar e pedir perdão. Ele iria onde ela fosse, em qualquer situação.
Ambos calados, pensando no que dizer.
Como penitência, ela mantinha silêncio. Porque ele sabia que era errado fazer aquele tipo de brincadeira.
Já era noite. Ela tinha medo de andar sozinha a noite, então aceitou sem dizer a presença de Alberto.
Ele pensava, e pensava, e quanto mais pensava, mais confuso ficava, e menos sabia o que dizer. Sabia apenas, tinha certeza, que seguiria sua garota onde ela fosse.
Eles não eram de brigar. Quando havia um desentendimento, conversavam depois de pensar no fato.
Eles não tinham o que conversar, Alberto deveria se explicar, perdir perdão mais uma vez e convecê-la de que, mesmo com a infantilidade, ela deveria ficar com ele; segundo as promessas: pra sempre.
Ela morava longe, a trinta minutos de onde estavam e precisava tomar um ônibus para chegar em casa. Quanto mais próximo o ponto d'ônibus ficava, mais ela acelerava o passo. Alberto foi seguindo.
Ele sabia que já havia errado bastante. Ele sabia que precisava mudar. Ele sabia que ela poderia dar um fim no romance. Ele sabia, principalmente, que não conseguiria mais viver sem tê-la ao seu lado. Ele sabia que era recíproco. Mas ele sabia que ninguém é obrigado a tolerar suas babaquices.
Finalmente, chegaram ao ponto, que estava vazio. Alberto havia pensado no que dizer, pelo menos em como começar a dizer:
- Olha, eu não quero dizer as mesmas coisas que digo toda vez que faço algo errado! Você não quer falar, tudo bem, concordo, mas você ainda têm ouvidos, então, me escute, mesmo que eu trave dizendo verdades que me machuquem...
O ônibus chegou, ela entrou. Ele, sem convite, entrou também. Ele continuou:
-Porra, Alice, porra! Tu sabes que eu ajo desse jeito com todos, amigos, familiares, desconhecidos e você. Sabe que é um sério problema mental que eu tenho. Sabe que é sem pensar. Sabe... Nunca é minha intenção te magoar. Quando você está longe, pra evitar que pense besteiras, eu começo a brincar, me distrair, e nunca é minha intenção te fazer lembrar daquele passado maldito...
"Nós já tentamos destruir esse meu defeito, lembra? Mas nós descubrimos que ele não morre, ele só pode ser controlado. Pouco me importo com qualquer outro, mas com você é diferente... sempre foi, desde o início. Foi diferente na conquista, na convicção, no primeiro beijo, em tudo! Por favor, seja diferente e me perdooe, mais uma vez. Não me ignore. Eu sei que eu sou um idiota, eu sei que eu errei, eu sei que eu digo as mesmas coisas quando erro. E você sabe que é um problema incontrolável. E eu sei que eu não deveria ter brincado sobre aquele assunto, mas você sabe que eu apelo a qualquer coisa pra fazer alguem rir. Você sabe, eu sou um palhaço natural e desproposital... Escute tudo, continue me ignorando, e quando quiser falar, estarei ao teu lado pra te ouvir..."
E ele prosseguiu com seu sermão, ela prosseguiu com seu silêncio, a hora de descer do ônibus chegava.
Ela desceu, ele seguiu. A rua era escura, Lice estava com medo, mas disfarçava, ele não se importava, acompanhava o silêncio observando seu maior vício andar e ignorá-lo.

Desde que entenderam que estavam realmente dependentes, fisica e mentalmente, um do outro, começaram a brincar, que ambos eram drogas, e ambos estavam viciados em suas drogas, drogas exclusivamente particulares. Às vezes as drogas causavam alguns danos, mas era tolerável, nada que impedisse uma nova overdose.
Cinco quadras de caminhada e eles, enfim, chegaram a casa de Alice. Alberto, que ainda não conhecia, se impressionou com o tamanho e a beleza da casa. Ainda era cedo, 20h, então Alice não se preocupou em tocar a campanhia, da própria casa. Ela não tinha as chaves de sua casa. Uma voz atendeu, liberou o portão, e antes de Alice entrar, ela pronunciou:
- Na minha casa você não entra!
Não era nem pelo erro, Alberto não entrava na casa de Alice pelo simples fato de sua família ainda desconhecê-lo. A mãe e os irmãos de Alice não sabiam da existência de Alberto, nem da importância que ele tinha na vida dela.
Ela entrou, bateu o portão, atravessou o jardim, abriu a porta da casa, entrou e bateu a porta. Alberto ficou ali fora, sem reação.
Por um segundo, ele teve vontade de partir e esperar que ela ligasse; mas não, ele não andou inútilmente para chegar até ali. Em pé, em frente ao portão, ficou ali, sozinho.
Alice deu "oi" à sua família, que estava na sala, fantasiou uma dor de cabeça, e foi para seu quarto. Se trancou.

Num intervalo de pensamentos, Alberto disse ao escuro:
- Pra piorar, poderia estar chovendo.
Não era intenção dele, mas funcionou como um prece. O céu, que não estava tão limpo, começou a se fechar. Nuvens surgiram do nada. Em instantes a chuva nasceu, intensa: como o romance de Alberto e Alice.
Alberto ignorou, continuou ali, sozinho. Depois de um tempo, a chuva passou, Alberto, inteiramente molhado, olhou as horas: 00:00
Ele achava uma besteira  de que: quando alguém vê que horas e minutos estão iguais, alguém está pensando  nesse alguém que viu as horas. Mas ele respeitava quem acreditva nisso, acreditava em Alice.
Ela era aficionado pela brincadeira, e acabou deixando Alberto esperto. Quando ele olhava o relógio, e o fato acontecia, ele lembrava de Alice, que era viciada nessa brincadeira.
Ele esperava que o "00:00" não tivesse sido em vão.
Ele lembrou de uma música, de uma das bandas favoritas de Alice, que dizia: "Não, não, eu não vou desistir assim..." Teimoso e persistente que era, disse à si mesmo:
-Eu só saio daqui quando ela implorar...

Alice, não estava pensando nele, estava relembrando os bons momentos e tentanto se reanimar com as lembranças boas.Não fazia ideia que seu garoto estava na rua, sozinho, esperando quem prolongava sua vida.
Alberto salvou Alice, como ela salvou ele da depressão e da vadiagem. Ela chegou em sua vida para estabilizá-la e pô-la de volta num rumo. Ele precisava de garantias que a mantivessem em seus braços. Começou a estudar.

A rua era escura, mas tranquila e livre de perigos. Perguntem se Alberto importava: Não, ele não se importava.
Uma das coisas que ele dizia que mais apaixonava e confortava Alice, era "Pergunta se eu me importo." Qualquer defeito irrelevante era destruído pelo jeito doce e compreensível de Alberto. Ele não se importava com defeito físicos ou materiais. Ele se importava em cuidar de Alice, em fazê-la feliz, em deixá-la viva. Se importava com Alice e com quem pudesse alegrá-la ou machucá-la. Motivo para se importar consigo mesmo.

Ele já ignorava as horas, mas não conseguia ignorar a dor que dominou suas pernas e seu pulmão.
A casa em sua frente começou a movimentar-se, um zumbido surgiu em seus ouvidos, o coração exigia mais ar para funcionar, o ar não obedecia, o escuro ficou mais escuro, o chão ficou mais próximo. Alberto desmaiou.

Alice pensava que Alberto já havia partido, tanto que estava esperando que ele desse um "oi" em qualquer rede social que participava. Mas ele não aparecia. Cansada, ela escolheu uma série de músicas e aumentou o volume. Ficou lá, deitada, sozinha, cantando, até adormecer.

Alberto foi recuperando seus sentidos. Primeiro, o pensamento. Depois, a voz, que fracamente pediu por Alice. Quando recuperou o tato, percebeu que onde estava deitado não era maisa calçada onde havia caído, era bem mais confortável. Enfim, voltou a visão.
Não estava mais na rua, era um quarto. Um quarto desconhecido em que a decoração se aparentava muito com o quarto de sua vó, mas não era pela cama de solteiro onde estava deitado. Ele simplesmente não sabia onde estava, e não encontrava uma pista que o respondesse.
Suas pernas e seu pulmão ainda doíam. Deitado, cansado, prefiriu ficar ali, quieto, agurdando a resolução do mistério: Que lugar é esse?
Ele ouvia um barulho, mas não sabia distinguir o significado nem a origem.
Pensando em Alice, se assustou quando a porta abriu. Entrou no quarto uma senhora dizendo:
- Como você está?
Alberto, meio com vergonha, questionou:
-Mas que lugar é esse? Quem é você?
-Meu quarto. Bernadette é meu nome.
Esse nome não lhe era estranho, ele já ouvira várias vezes mas não lembrava de quem... Alice, foi ela quem citou esse nome. Ele lembrou:
- Você... Não!... Você é a mãe da Alice!

Era ela mesma. Ela e seu outro filho, Caio, recolheram Alberto para sua casa, sem noticiar sua filha. Ela já conhecia indiretamente Alberto:
- Calma! Nem toda sogra é bruxa. Até mesmo porque toda sogra é mãe. Tua mãe é sogra, portanto não tenha ódio de sogras... Enfim, eu sei que você é o Alberto, o garoto que namora minha  filha, sem minha autorização... Mas fique tranquilo, a internet é incrível, me ajudou a descobrir esse romance sem sequer minha filha saber...
Era certo que ele ficaria pasmo ao saber disso. Mas lembrou da filha de Bernadette:
- E onde Alice está?
-No quarto dela, trancafiada, no escuro, com suas músicas.
- Que horas são? Quanto tempo eu fiquei desacordado?
- Já passou das três horas. Bom, quando eu e meu filho te recolhemos já passava da uma hora.
-Caramba... Não sei nem o que dizer.
-Não precisa. Se quiser dormir mais, durma.
-Não! Eu quero ver Alice!
-Bom, se você conseguir entrar no quarto dela... eu autorizo o namoro de vocês.

Quatro meses, e a mãe de Alice nem sabia. Como se fizesse diferença.

Alberto tentou levantar, mas uma tontura o fez sentar. Acalmou-se e perguntou a recém-conhecida sogra:
-Onde é o quarto dela?
- Vem comigo...

O som era aterrorizante, a porta estava trancada. Bernadette pediu silêncio. Alberto fez sinal de "tudo bem". A sogra foi embora. Ele se aproximou da porta. Reconheceu a música, era uma que ele odiava mas Alice amava.
Ficou em pé, em frente a porta, pensando no que fazer.
O nível de ódio da música seguinte aumentou, e foi crescendo, sucessivamente.
Ele sentou, na parede oposta à porta, de fronte a porta.
Um silêncio enfim surgiu. Alberto conseguia ouvir lágrimas vindas do quarto. Óbvio que eram de Alice. Ele sentiu vontade de chorar, pelos erros que a motivaram a chorar.
O silêncio deu lugar à calmaria de uma canção. A favorita do casal. Instantes após o início, a porta se abriu.
Alice, em lágrimas, permaneceu muda. Alberto, acompanhando a música, declamou:
- "...just hold me tight. Lay by my side and let me be the one..."
Alice atravessou o corredor, sentou-se ao lado de Alberto, deixou que os braços dele a envolvessem, e permaneceu muda.
Alberto, que não conseguia chorar por motivo qualquer, abraçou Alice fortemente, como se gritasse: "Eu sou o único, você não tem escapatória. Você é minha, tanto quanto eu sou teu."
Alice, brincando com os dedos de Alberto, como sempre fazia, disse calmamente:
-Porra, Alberto... - e deixou ser levada por Hipnos.
Alberto, perdoado, sentiu-se vivo mais uma vez, e acompanhou sua mulher na incrível jornado do sono.

Os dois ficaram ali, no corredor escuro, juntos, viciados,  até que a vida os chamasse para sair.

2010/04/22

Impedimento

Era um feriado no meio da semana, e Alberto aproveitou para assistir o show de um artista de que há muito tempo não assistia.
Antes do espetáculo, ele estava sozinho, quando encontrou ao acaso um grupo de antigos amigos. Decidiu ficar com eles, para fugir da solidão e das tentações.
Toda a poesia cantada pelo artista, um de seus favoritos, o fazia viajar mentalmente, mesmo estando em um lugar onde refletir era difícil; pelo simples fato de estar lotado de pessoas, suor e luzes.
Apesar de um grande pesar, Alberto aproveitava o show. Cantava as musicas que possuíam algum significado para ele, observava atentamente todo o talento dos musicistas, se encantava com o talento poético do cantor...
Mas nos intervalos entre as músicas, ele olhava para seu peito, pegava seu cordão, lembrava de quem o havia dado, e entristecia.

Aquele cordão, Alberto ganhara de sua namorada, Alice, e significava muito para ele.
Ela, não pode ir àquele show, pois precisou viajar de imediato para o interior catarinense visitar um parente adoentado. Deixando Alberto sozinho e desmotivado.
O relacionamento dos dois começou depois de um show, onde Aberto vendeu o ingresso de um amigo, que não pode ir, a Alice. Na mesma noite começaram a conversar e perceberam grandes interesses e ideias em comum. Nos dias seguintes, encontraram-se para conversar mais e mais. Quando perceberam, já eram dependentes químicos um do outro. Fazendo assim que nascesse um grande romance. Onde não havia apenas amor, mas também, respeito, confiança, liberdade...
Alice salvou a vida de Alberto que, antes de conhecê-la, era um garoto perdido e atormentado pela luxúria.
Ele era tão viciado nela que nenhuma garota roubava sua atenção. Nenhuma. Pode ser clichê, mas: ele só tinha olhos para Alice.
Alberto não era bonito, mas possuía boas roupas e ideias claras, que tornavam sua feiúra invisível.
Alice era linda, mas não era só isso que fazia Alberto amá-la.

Aquele show estava super-lotado, mas Alberto só se importava em ouvir as versões ao vivo de músicas que o agradavam em qualquer momento, de paz ou tristeza.
Quando foi anunciado que o show chegava à suas últimas músicas, o local começou a esvaziar, possibilitando que Alberto pudesse ver pessoas que antes não podia ver. Foi numa dessas, que ele viu algém que o fez voltar no tempo. Nos tempos em que Alice era desconhecida, e qualquer garota o atraía.

Heloísa, estava lá. Heloísa, a grande paixão carnal de Alberto da vida pré-Alice.
Os dois tiveram um caso movido apenas por atração física.
Não havia qualquer conversa ideológica entre os dois. Apenas um desejo carnal nunca satisfeito. Eles tinham a necessidade de se tocaram, mas só isso. Conheciam-se pouco, ideologicamente. Mas conheciam muito bem o corpo um do outro.
Quando separados, sentiam a necessidade extrema de sentirem a pele do outro. Quando juntos, nunca estavam satifeitos.
Eles não assumiram um namoro. Até mesmo porque é impossível existir romance movido apenas pelo desejo carnal. Mas eles não ficavam com outras pessoas. Os dois se desejavam, mas não se entendiam.
Se encontrvam sempre, shopping nos dias de semana, qualquer show aos sábados e domingos.
Até que, um dia Heloísa viajou à França para fazer um intercambio. Albertou soube disso através de amigos. E decepcionou-se por não saber pela boca de Heloísa, que sumiu sem avisar.

Meses depois, Alberto, já não lembrava de Helóisa, e conheceu Alice, que transformou sua vida, de indecente para real. Ele sentia-se vivo pela primeira vez na vida.
Sentia dores quando longe de Alice. Tinha batimento cardíaco acelerado quando encontrva Alice. Sentia.
Já nem sabia mais quem era Heloísa, nem lembrava de toda aquela paixão ardente que viveu com ela.

Heloísa estava ali, a cerca de cinco metros dele.
Tocava uma música que o fez lembrar de muitos momentos vividos ao lado de Heloísa.
Com seus olhos fixados naquela, que havia mudado, Alberto já ignorava qualquer coisa que o rodeava, até mesmo a Música. Ele não parava de olhar para ela. Era como se a visse pela primeira vez. Era como se ela fosse desconhecida. Era como se fosse paixão a primeira vista. Era como se Alice não existisse.
Até que Heloísa encontra os olhos de Alberto a mirando intensamente, e logo disfarça. Olhando para o palco, não deixa de soltar um olhar apreensivo e surpreso. Cutuca uma amiga, e comenta qualquer coisa no ouvido da amiga. A amiga olha para Alberto e se assusta. A amiga puxa Heloísa, como se quisesse fugir. Mas Heloísa não quer. Olha mais uma vez para Alberto, solta um sorriso tímido, e logo disfarça, olhando para o palco.
Heloísa mudara muito desde o último encontro com Alberto, mais de dois anos antes daquele reencontro. Alberto estava encantado com aquele novo estilo de Heloísa. Um tanto quanto Francesa. Mas fisicamente, ela mudara pouco. Ela tinha o mesmo olhar, inocente, que fizera Alberto se encantar, e querer a todo instante aquela moça.
Sua vontade naquele momento, era ir ao encontro de Heloísa e dizer tudo o que sentisse vontade.
Todo aquele fervor que sentia, voltara. Queria agarrar, beijar, tocar, sentir o suor daquela moça. Mas algo o impedia.
Ele pouco se importava com os sentimento de Heloísa. Ele queria, ele desejava, ele necessitava, tocar aquela moça. Tocar seus lábios nos lábios daquela moça. Mas algo o impedia.
Aquele encantador olhar não havia mudado. A fome de Alberto aumentava a cada instante; ele precisava ter em seus braços aquela moça. Mas algo o impedia.
Ele percebia que ela também necessitava tê-lo entorno de seus pequenos braços.
Aquela baixa estatura não mudara. Aumentando vontade de carregar aquela moça aonde o vento levasse. Mas algo o impedia.
Ele estava disposto a ir até a moça e dominá-la como nos tempos antigos. Mas, por impulso do subconsciente, ele agarrou seu cordão. E, qualquer toque ao cordão, fazia que a imagem de Alice aparecesse à sua mente.
Imediatamente arrependido, Alberto parou de observar Heloísa, e focou-se nas luzes do palco, que o cegavam, como penitência. Alberto lembrou de quem não deveria ter esquecido. Alberto não parava de tentar lembrar dos sorrisos de Alice. Alberto precisava de um abraço, que só Alice sabia dar. Alberto necessitava da presença de Alice.

O show acabou. Alberto despediu-se dos amigos e partiu. Foi para sua própria casa, que ficava à poucas quadras de onde o show ocorrera. Alberto foi correndo, como se fosse ao encontro de Alice. Alberto correu, desejando esquecer aquela moça do show. Esqueceu, quando quase foi atropelado por um táxi. Esqueceu, quando chegou em casa. Esqueceu, quando ligou seu rádio e dormiu ao som da música que amava ouvir ao lado de Alice. Dormiu, como se esivesse com Alice.

Acordou, com o barulho de seu celular. Era Alice ligando. Atendeu, e lembrou que aquela voz no outro lado da linha, era o que o motivava a viver. Ela estava chegando na cidade.

Sem preocupações ou lembranças ruins. Alberto correu ao encontro de Alice

2010/04/18

Deitar e amar... (Parte DOIS)

Estávamos lá, deitados. E quietos. Estávamos lá, felizes por estarmos juntos, de verdade, dispostos a recuperar o tempo perdido, e o amor que não conhecíamos há um bom tempo.
Estávamos lá, quietos. Eu estava feliz só por saber que ela queria recuperar nosso amor. A felicidade era tanta, que minha boca não tinha o que dizer.
Até que ela disse:
-No que você está pensando?
Respondi com toda minha sinceridade:
-Ah, meu estômago está doendo. Penso em chegar em casa e fazer uma macarronada, só para mim.
-Então vá! Eu fico aqui, tentando paquerar um qualquer que passar por aqui.
Sempre precisava de um tempinho para responder toda aquela sua agressividade irônica:
-Quando eu digo: "para mim". Quero dizer para nós! Porque você já faz parte de mim. Sabe, você é um orgão meu. Sem você, anemia, falta de ar e cegueira, me atingem facilmente. Sabe, dependo de você para viver...
Enquanto dizia tudo aquilo. Deitado, olhava para o céu, e gesticulava intensamente com as mãos. Até que percebi um suspiro, indecifrável. Olhei para aquela garota que estava ao meu lado, e me emocionei com a emoção que seus olhos que me olhavam.
Tenho dificuldade para chorar. Mas naquele momento, minha única vontade era imitar o gesto daquela garota que me deixava encantado a qualquer momento, tanto no felizes quanto nos tristes.
Em qualquer momento, eu sentia necessidade de estar ao lado de Melina. Mas ela andava um tanto quanto distante. O que era ruim para nós dois. Eu precisava de seu sorriso, precisava de suas palavras. Mas ela andava quieta, como se não existisse um cara que dependesse totalmente dela para viver.
Nos encarávamos, intensamente. Depois daquele meu "sermão", e a reação de Melina, não tinha forças para continuar a falar. Depois de algumas lágrima soltas, alguém precisava limpar seu rosto. E essa função era minha, sempre foi.
Com a manga de minha camiseta, sequei as lágrimas. E ela, com um sorriso simples, o mesmo que me conquistou há cinco anos, agarrou minha mão, e disse:
-E o que eu respondo depois disso?
Confortado com toda aquela mágica, respondi:
-Nada!
Apertei mais ainda a sua mão. E envolvi aquele pequenho e magro corpe entre meus braços. Para que ela tivesse certeza de que eu estava ali, com ela. E ficamos lá, deitados e abraçados, em silêncio.
Meu coração batia rapidamente, impossibilitando que palavras se formassem em minha boca. Mesmo com riscos de ter uma parada respiratória, ou cardíaca, não me importava. Pois não existe modo melhor de morrer do que estar ao lado de quem se ama.
Sentindo sua respiração e seu corpo, começei a viajar entre as nuvens. Não conseguia refletir sobre coisa alguma, só me concentrava em contar as batidas daquele coração, que estava próximo ao meu.
Silêncio, entre nós. As crainças gritavam atrás de bolas e cachorros latindo. Os passáros migravam pelo parque. Rodas de skates e bicicletas arranhavam a ciclovia. Mas tudo isso, não me importava.
Sentia a cabeça de Melina, subir e descer, com os movimentos da minha respiração. Pensei em para de respirar, só para meu peito não a encomodasse tanto. Mas morto, talvez eu não poderia ficar com ela, cuidando dela.
Fechei meus olhos, me concentrava na respiração de Melina, e toda aquela calma que sua presença me causava. O branco das nuvens aparecia, mesmo eu estando com os olhos fechados. Fiquei assim: nuvens, Melina, nuvens, Melina...
A anestesia era tanta que o tempo parecia não passar, mas toda aquela agitação do parque foi sumindo. Mas não me importava. Até que senti uma pequena pancada na costela.
Abri meus olhos, assustado. Com medo de que houvesse algo de errado com Melina.
O que vi foi um Guarda Municipal, nos encarando. Com autoridade, ele perguntou:
-O que estão fazendo aqui? O parquejá está vazio.
Enquanto ele perguntava, olhei para meu outro lado, me certificando de que Melina estava bem. Estava bem, coçando os olhos, depois de dormir, por não sei quanto tempo. Esqueci da pergunta do Guarda, só queria ficar aquele rosto sonolento acordar. Lembrei da pergunta, e respondi:
-Nossa, nós deitamos aqui e dormimos, perdemos a hora!
Melina, olhou para o  Guarda e disse:
-Ei, Guarda Belo, nós podemos dormir por aqui?
Melina adorava arranjar apelido para conhecidos recentes. Com medo de que o Guarda
surtasse, me levantei, puxei Melina, e falei:
-Desculpa, seu Guarda, nós já estamos indo, só precisamos...
Precisaríamos de nossas bicicletas para voltar para casa. Mas as mesmas, não se encontravam no local. Surtei:
- CARAMBA! Onde estão as bicicletas!!?
O Guarda, com toda a calma do mundo, anunciou:
-Calma, garoto. Eu as recolhi, e guardei na central de informações.
Confuso, perguntei, como autoridade:
-Por que?
- Você prefiria que alguem marginal as roubasse? Melhor que elas ficassem guardadas, em segurança. Venham comigo, entrego as bicicletas, e vocês podem ir embora.
Fomos, pegamos nossas bikes, agradeçemos ao Guarda. E partimos.
Andando, fomos indo, com nossas bicicletas ao lado.
Já escurecia. E sim, nós dormimos o dia todo no Parque. Foma era uma coisa que me dominava.
Mesmo que não tenhamos conversado sobre nosso relacionamento, e a terrível fase que havíamos passado. Aquele dia no parque foi incrível, calmo e simples. Bem a cara de Melina.

2010/03/08

Deitar e amar... (Parte UM)

Já se passava das quatro da manhã, e eu já não sabia o que fazer ou para onde ir. Todo aquele tédio já não era benéfico. Estava há mais de cinco horas deitado assistindo à maratona de um seriado de humor clichê que não era mais tão divertido. Pensava em um meio de me entreter ou esquecer todos os problemas que me enforcavam. Não encontrava resposta alguma para solucionar minha dor.
Deitado em uma cama tão grande, estava totalmente vazio. Nenhum livro, filme ou musica me animava. O que poderia me alegrar parecia estar tão longe, parecia ter um preço a ser pago, parecia não ser para mim.
Depois de um tempo mudei de canal, mesmo sabendo que não encontraria nada decente. Começou a Santa Missa, e isso me motivou a desligar a tv e tentar dormir.
Pensei que Melina estivesse morta, mas então, depois de horas, ela disse:
- E então, Rafael, vai ficar deitado aí ou aceitar minhas desculpas?
- Desculpas, do que?
Finalmente, lembrei o que estava faltando em mim. Ela era há muito tempo o que me mantinha vivo, mas atualmente nos distanciamos, mesmo dormindo na mesma cama, tudo graças àquele maldito curso de teatro que fazia lavagem cerebral nos alunos. Mel foi vitima, e esqueceu de viver, esqueceu de mim. E eu, solitário, esqueci de viver. Continuou ela:
- Sei lá... Por ter abandonado esse amor tão forte que sinto por você.
- Não sei... Acho que ambos desistiram desse romance por um tempo.
- Ah, eu comecei com aquele maldito curso e abandonei tudo. E como, já diz a canção, "o comodismo é um mal parasitário", acho que te passei um pouco dessa minha desmotivação.
- E você quer recuperar todo o tempo perdido?
- Agora!
- Mas são seis horas da manhã de domingo!
- Bom, pelo menos já tem onibus circulando, podemos andar por aí.
- Hum... Vamos esperar o mercado abrir, comprar coisas e fazer um pique-nique no São Lourenço.
Levantei, abri a cortina e me assustei com o belo nascer do sol. Melina já estava sentada, resolvi sentar ao seu lado. Ficamos calados até que ela exclamou:
- O mercado não abre aos domingos!
- Eita... Será que as nossas bicicletas estão úteis ainda?
- Já sei, pegamos as bicicletas e saímos pela cidade até encontrarmos um lugar bacana para sentar e conversar.
- Boa, mas poxa, já estou há horas aqui deitado e sem comer. Preciso comer alguma coisa, nem que seja uma bolacha.
Não sei como encontramos motivação para sair, pois estavamos há horas deitados mas sem dormir.
- Na minha bolsa tem um pacote.
- Beleza, mas antes vou tomar banho.
- Que mané, banho! Vamos assim mesmo! Queremos recuperar nosso amor, não queremos paquerar ninguém, nem conseguir emprego. Afinal, é domingo, e alias, adoro esse teu pijama.
- Tá bom, mas antes...
- Cale a boca!
- Ok, então... sem energético para nós.
- Opa! Aí você apela para o vício! Pega lá algumas latas, e vamos logo.
- Já vou, mas antes...
- Ah, chega!
- Não quer um beijo? Tá bom...
- Sem problemas, eu tenho o dia inteiro para te roubar um.
- Isso se você conseguir me alcançar!
Corri, como nos velhos tempos. Uma criança correndo rumo a felicidade. E eu não sabia que desde pequeno eu estaria destinado a viver com uma garota que, não tinha roupas de marca, não tinha carro, não tinha dinheiro, não tinha vícios além de "Rafael", tinha apenas um coração que me conquistava todo dia, mas apesar disso andava distante. Porem, tenho certeza que daqui pra frente, se tornará uma necessidade fisiológica. Se me perguntassem o porquê de eu gostar ela, só responderia: porque ela gosta de mim, e ela gosta de mim porque eu gosto dela, eu gosto dela porque ela gosta de mim... Enfim, é um ciclo, confuso. Looping após looping.
Fui até a cozinha pegar uns energéticos e doces, nossos vícios. Apesar de nossa vida ter um aspecto "vagabundo", nós não bebíamos, não fumávamos, não injetávamos, não... Resumindo, não usávamos drogas. Nunca experimentei e nunca tive vontade, já sou "louco" demais. Lina, tomava remédios para dormir e para depressão. Problemas que, milagrosamente, sumiram de sua vida quando me conheceu e veio morar comigo.
Melina gritou do "quartinho" querendo que eu pegasse minha bicicleta e saíssemos logo. Partimos sem rumo certo.
Fomos dançando entre as ruas da cidade, observando as placas de pontos turístico, e procurando algum que nos atraísse bastante. Jardim Botânico, Praça do Japão, Parque Barigui, Praça 29 de Março, Bosque João Paulo II... Nenhum destes foi escolhido, eu queria Parque São Lourenço, mas Melina insistiu e insistiu no Parque Tanguá. Então, para lá fomos.
Depois horas para chegar ao parque e encontrar um lugar tranquilo, finalmente chegamos e encontramos um recanto ao pé da colina. Largamos nossas bikes ao chão, e deitamo-nos.

2010/02/28

Furacão (Incompleto)

-... Seja! Ame! Mude! Como bem entender!
Estava lá, eu, cantando e sentado ao lado de minha nova conhecida Sílvia, ouvindo, depois de um louco acontecimento, em seu mp3 as músicas da banda que havia terminado, há pouco mais de uma hora, um dos shows mais intensos de minha vida.

Era a primeira que vez que saia com o carro que havia comprado recentemente, após muito empenho, e já consegui me dar mal. Estacionei-o no estacionamento ao lado do bar, sem saber que fecharia bem antes do show acabar. Resultado: meu carro ficou preso lá, me deixando sem meio de transporte para voltar pra casa. Já que não existia onibus madrugueiro para meu bairro. Só me restava ficar por lá e esperar o estacionamento abrir. O bar foi esvaziando, havia alguns bêbados, e eu, sem ideia do que fazer. Enfim, o lugar precisava fechar, então saí, caminhei uns dez passos para a direita e sentei me encostando no muro do estacionamento, quando avistei há uns dez metros à esquerda da porta do bar, uma garota sentada no meio-fio, sozinha, aparentando ter frio.
Era primavera, mas naquela noite a temperatura da cidada estava incrivelmente baixa. Gentil que sou, fui até ela oferecer ajuda:
- Oi, é... Tá sozinha? Precisa de ajuda?
- Oi... Você é algum estuprador, sequestrador ou assaltante?
- Ha... Não! Sou vegetariano, solteiro e auto-sustentável.
- Que?
- Nada... Sério, precisa de ajuda?
Sentei ao seu lado e fiquei tonto com tanta beleza. Cabelo negro e olhos castanhos nada normais. Calei-me, só observava. Depois de uma longa transe, ela me interrompe e pergunta:
- E aí, gostou do show?
- Como você sabe que eu esyava no show? - Perguntei na sinceridade, pois não tinha visto ser tão bonito lá dentro.
-Ah, eu te vi lá, pulando com todas as musicas.
- Poxa, foi incrível. Nunca antes assisti à um show tão potente e emocionante. Foi o melhor da minha vida... E você, gostou?
- Bom, faltaram algumas musicas, mas as que eles tocaram são muito boas, e são muito diferentes das versões do cd.
- Pois é, eles piram ao vivo.
- E você está fazendo o que aqui ainda?
- Haha, meu carro ficou nesse estacionamento aqui, e eu não tenho como voltar para casa. E você, esperando alguém?
- Estava, mas acho que o alcoólatra do meu irmão esqueceu de mim.
- Uau... E agora?
- Ha, não faço ideia. Acho que vou ficar aqui, na esperança de não ser assaltada ou coisa do tipo, até amanhecer e ir caminhando até minha casa.
- Posso ficar aqui com você até lá. - Na inocência, perguntei, mas ela me olhou estranhamente, pensando que eu tivesse segundas intenções. Bem, não tinnha segundas, tinha terceiras, quartas, infinitas intenções com tão bela garota.
- Se não for pedir demais, sim. Preciso de companhia pois tenho medo da madrugada curitibana e seus crimes. E mais, gostei de você, parece ser simpático.
Imitei o pinguim de "Madagascar":
- Você não viu nada!
- Ui, que misterioso.
- He... Então, conte-me mais sobre você.
...
Depois de um prazeroso bate-papo sobre nós e nossas paixões, Sílvia pegou seu "tocador de musicas" e o ligou no "modo aleatório". Começamos a filosofar sobre uma musica chamada "O mito do insubstituível". E depois de um longo silêncio, após a musica acabar e o aparelho ser desligado, ela disse:
- Quer saber? Cansei!
- Por que?
- Cansei de me iludir com vagabundos. Concluí que é melhor eu atar um relacionamento com um desconhecido e construir e fortificar um amor. Sabe, tipo, arquitetar uma vida à dois que funcione e tal... - E ela foi falando e falando, enquanto observava seus grossos lábios, me surgia uma vontade louca de beijá-la, até que o inesperado acontece... Ela me agarra e me beija fortemente, como se quem fosse o homem ali fosse ela.
Silêncio, ambos não tinham o que falar após o ocorrido. Na verdade, não tínhamos folego para pensar em algo. Até que ela liga novamente seu mp3 e escolhe uma musica. Caí na real, percebo que Melina fez me crescer um sentimento forte nunca antes sentido. Não queria mais largar daquela garota. De repente uma grande alegria me domina.
Ouvi com atenção a primeira parte. Quando o refrão chegou, explodi:
-... Seja! Ame! Mude! Como bem entender!

2010/02/01

Uma baratinada monstro a dois (Parte DOIS) - Não me deixe sangrar

"Eu entrei em pânico ao saber que esta era a casa em que viveria e aquele era o rapaz que a dividiria conosco. Era igual ao anão amarelo do filme "Sin City", asqueroso, feio e deformados. Sebás, partiu em sua direção e o abraçou fortemente. O monstro veio em minha direção, Meu amor disse meu nome, e ele todo efusivo exclamou: Norah, é um prazer recebê-la em minha casa! Fique a vontade.
Tentou me abraçar, mas com nojo, evitei. Quando percebi, Sebás, estava sobre a mesa aspirando aquilo que Jardel manuseava quando chegamos. Assustada perguntei a Sebastião o que ele estava fazendo. E ele, todo enrolado, me perguntou o porque do espanto e aquilo seria só o começo.
Corri em direção a porta, mas Jardel, ligeiro, bloqueou meu caminho, impediu que eu fugisse me mostrando uma arma, e disse:
- Ô, eu disse que a festa está só começando! Então, senta lá, que nós temos uma história.
Olhei para Sebás, que estava entretido com o que estava na mesa, e pedi socorro. Ele me encarou e gritou:
- Senta logo, idiota! E ouve a história.
A partir desse momento senti um ódio mortal daquele que era perfeito para minha vida, mas mudou ao entrar naquela casa. Furiosa, corri em sua direção e ele repetiu "Senta logo!", e me deu um soco, que me fez cair, depois disso, desmaiei.
Acordei atordoada e ferida, mas logo sensações novas fluíram por mim. Um certo calafrio, misturado com euforia, tranquilidade, sonolência, calor, cegueira e dor de cabeça. De repente, senti uma pequena dor nos braços. Olhei, e vi dois furinhos com um pouco de sangue, um em cada braço. O sangue já estava seco, o que provava que adormeci por um bom tempo. Estava deitado no sofá, pelo menos o favor de me acomodarem eles fizeram. Não havia ninguém na sala. Queria saber onde estavam e o que fizeram comigo. Levantei, meio zonza, e vi uma seringa suja e alguns objetos jogados na mesinha de centro. E pelos meus conhecimentos, eles haviam injetado heroína em mim. Pretendia experimentar isso, mas não tão cedo assim, e nem quando estivesse dormindo, que covardia deles. Apesar da boa sensação que sentia, estava furiosa com todas as mentiras que me cercavam desde que conheci o Maldito Sebastião.
Meu Deus! Se é que Ele ainda cuida de mim. Naquele momento, Ele foi o primeiro alvo de minhas críticas. Uma vez li num livro de meu pai uma frase polêmica, "Se existisse um Deus bondoso e todo-poderoso, teria feito exclusivamente o bem", e pensando na minha vida, sempre tratei meu pai bem, nunca cometi algum pecado tão grave, nunca fiz nada de grave com outras pessoas..."
-Oi? Repete a ultima frase, por favor?- E, Tomas, o ouvinte atencioso ataca com sua ironia. Apesar de estar entretido com a história, a ultima fala de Norah não podia passar limpa.
-Tá... eu sei. Mas na situação que estava não raciocinava muito bem. Posso continuar? Não durma!
-Pode, claro! Sinta-se à vontade!
- Então... "Possuída por um ódio fulminante, não tive vontade de fugir. Estava xingando Deus e o mundo, quando eles chegaram, trajando umas roupas escuras e com sorrisos enormes em seus rostos. E o anão amarelo disse:
-Tá mais tranquila, agora?!
Fiquei quieta pois a raiva me impedia.
- Tá, é? Tá calminha? - chegou mais perto de mim, enquanto Sebastião preparava alguma coisa de costa para nós- Tá de boa? Então, vamos conversar?
- Fala logo, seu cretino podre!
- Podre, não! Não fala assim do teu novo chefe! - Finalmente Sebás olhou para mim. Acendendo um "cigarrinho".
Ainda meio lesada caminhei na direção dele. Encarei-o e perguntei o porque de todas aquelas mentiras e juras de amor.
- Calma, gata! Tu acha que se eu dissesse que iria te trazer à Portugal para trabalhar para nós, você viria?
- Filho da... - Como Dama, deveria ter dado um tapa, mas a raiva fez com que eu o socasse, bem no nariz. Voltei a sentar no sofá e perguntei:
-Quando é que eu vou embora? Eu quero sair!
- Poxa, a gente te dá duas "picadas" e você quer sair sem retribuir? - E o monstro amarelo falou.
- Vocês não deviam ter feito isso! Poxa, picar uma pessoa desmaiada é covardia! - os dois se encararam - E, como assim, "patrão"?
- É o seguinte, madame, escuta o patrão aqui...
E ele contou, quero dizer, anunciou meu futuro, tudo o que viveria nos próximos anos.
Seria obrigada a morar com eles, realizar tarefas domésticas (e sexuais); trabalhar para eles, vender os seus produtos e se necessário, meu corpo. Seria escreva deles, faria o que eles bem entendessem. No fim do mês, ganharia mais trinta dias de vida, comida, a droga que quisesse e a garantia de que meu estivesse vivo. Prometeram que se eu discordasse deles ou tentasse fugir, fariam de tudo para me destruir, atingindo meu pai. Mostraram-me todo seu arsenal, e eu indefesa e pressionada, aceitei aquilo que seria minha vida nos próximos dezessete meses.
Bem, poderia relatar todas as minhas experiências, mas são muitas então iria demorar meses para terminar. Só digo que foi uma época horrível. Sofri, apanhei, tive overdose, cometi os piores pecados, fiz coisas sem ter vontade, etc. Mas vivi tudo isso, estragando meu corpo e minha mente, para garantir que a vida de meu pai continuasse intacta. Em Portugal, fui obrigada a fazer muitas coisas sem o meu consentimento; nunca fui de receber muitas ordens, mas precisava assegurar a saúde de meu pai. Uns meses depois desde minha chegada lá, consegui juntar uma boa quantia, que cobriu minhas despesas de viajem, então decidi enviar dinheiro ao meu pai, sem qualquer carta ou explicação, porem não sei se ele recebeu.
Um ano e meio depois, o anão amarelo queria que eu fizesse programa com seu irmão e mais um casal, e, acredita, o velho era mais horripilante que o anão. Recusei, mesmo sendo obrigada e sabendo que meu corria riscos caso eu recusasse. Estávamos na cozinha, enquanto eu preparava um sanduíche ele preparava uma picada. Comecei a me irritar com seus gritos me obrigando a obedecê-lo. Pensei em tudo o que tinha se passado até então, e concluí que se meu pai não tivesse morrido de desgosto quando fugi, ela já estaria no fundo do poço, igual quando perdeu Margarethe, sua segunda esposa falecida, e minha madrasta. Comecei a pensar em mim, precisava mudar de vida, realizar meus sonhos que havia abandonado em Curitiba. Sebastião nunca estava em casa, o que facilitava minha fuga. Com uma faca no bolso, caminhei até o anão, olhei bem para ele e disse "Não!", em seguida, dei cinco facadas em sua barriga, peguei a seringa e perfurei seu pescoço três vezes. Ele caiu, desanimado, sem vida. Me ajoelhei e dei mais algumas facadas no corpo dele. Fui até o quarto, peguei só minha mochila pois não tinha roupas limpas, vasculhei as gavetas dos rapazes, peguei todo o dinheiro, e todas as drogas, que consegui. Fugi, finalmente. Precisava sumir daquela cidade, daquele país, mas não tinha verbas suficientes para retornar ao Brasil. Vaguei, sem esperanças, até a auto-estrada mais próxima. Encontrei um placa dizendo "Paris 1734 KM, Madrid 628 KM, Barcelona 1409 KM...". Era meu sonho conhecer a capital francesa, mas como não sabia falar francês mas sabia espanhol, decidi na hora em ir para Barcelona, arranjar algum dinheiro e para voltar ao Brasil. Consegui carona com um caminhoneiro italiano, mal nos entendiamo mas ele entendeu um pedaço da minha historia e concordou em me levar até Barcelona, era caminho para ele, que estava voltando para sua terra após uma entrega.
Enfim, cheguei em Barcelona não fazendo ideia do que faria a a partir daquele momento. Encontrei um hotel três estrelas chamado "Recanto Tropical", que para minha sorte era de brasileiros. Me hospedei lá. Perguntei para a recepcionista, brasileira, se ela sabia onde eu poderia arranhar emprego, ou qualquer outra fonte de renda, respondeu:
- Sim, estamos precisando de uma auxiliar de cozinha. Você precisa ter dezoito anos e alguns documentos, mas se não tiver, nós damos um jeito.
- Nossa, que ótimo! E quando começo?
- Antes você precisa ser entrevistada pela gerente do hotel.
- E onde está ela?
- Bem aqui, na sua frente. Vamos até minha sala conversar, por favor.
Então, fui entrevistada e contratada. Ganhei desconto no aluguel de um quarto, e trabalhei lá por dois anos. Já havia feito amizade com o povo brasileiro e integrada à vida noturna da cidade. Ganhei muito dinheiro com as coisas que roubei da casa de Lisboa. Fiz algumas amizades, mas uma em especial me ajudou muito. Ninguém sabia seu nome real, mas todos a chamavam de "Rachel Lux, la brasileña". Ela me fez abandonar a estadia e o emprego no hotel, para morar com ela, dividir despesas e trabalhar com ela em uma livraria. Nos tornamos grandes irmãs, compartilhamos histórias, vícios, segredos e sonhos. Ela também queria voltar ao Brasil. Trabalhamos duro para conseguir o dinheiro, e depois de muito tempo conseguimos voltar. Na véspera da viagem, brigamos seriamente por causa de um certo vício meu. Ela voltou para sua terra natal, e eu, destruída e sem reputação voltei para cá, sem esperanças de encontrar alguém.
Eu já nem sei se meu pai está vivo hoje. Nem sei o que aconteceu nessa cidade desde que sumi. E quero que você me conte tudo."

2010/01/29

Imediato

Ganhei meu tão esperado celular e fui logo divulgando-o para galera, via email e etc. Cerca de quinze minutos depois recebo uma mensagem, de um numero até então desconhecido, dizendo "Tá fazendo o que? Me encontra no Mueller daqui uma hora. Te espero lá. Beijos. Heloísa".
Finalmente, com a ajuda do telefone, poderia estar disponível para todos meus amigos, mas não esperava que "ela" quisesse me ver tão cedo. Pois havíamos nos conhecidos dois dias antes, no restaurante de seu pai, que foi meu professor de matemática por sete meses na oitava série, um dos melhores.
Enfim, louco para revê-la, fui logo me arrumando. Mas que roupa vestir eu não sabia, ela não disse nada sobre isso, e pelo tom da mensagem ela queria algo imediato. Fiquei no meio termo, não tão sujo mas nem tão limpo. Vesti meu jeans de duzentos reais, minha camiseta velha do Kings of Leon, exagerei no perfume, baguncei o cabelo, roubei uns chicletes de minha irmã, pedi dinheiro para minha mãe, abracei todas e parti rumo ao shopping.
Como eu saí as pressas, não vi que horas eram e nem quantas faltavam para a hora marcada. Resultado, cheguei lá vinte e cinco minutos antes do combinado.
Encostei-me na parede próximo à porta do Mueller e fiquei vendo as pessoas. Aquele era um lugar em que podia se ver de tudo e todos, (estilos, cores, bandas, penteados tatuagens,...). Mas, naquele momento, nada mais me atraía do que a dona daquele belo par de olhos verdes, que aliás, estava demorando para chegar.
Depois de ser praticamente abusado por duas garotas estranhas que não paravam de me olhar, avistei na longínqua esquina um vestido verde e um sapato vermelho. Fui andando naquela direção, meio em dúvida, mas deduzi que fosse ela. E era, quando me viu acenou e eu acelerei meus passos, sorri e, ainda de longe, fui retribuído com um largo sorriso.
Fomos nos aproximando, e quando ficamos frente a frente, só pensei em uma coisa:
- Nossa, como você está linda!
- Adoro Kings of Leon! - foi essa sua resposta, seguida de um abraço, íntimo demais para pessoas tão pouco íntimas.
Fomos indo em direção ao shopping, pouco me importava. Não olhava para a frente, trombava com quem vinha contra mim, só não conseguia parar de olhar para ela. Meu coração parecia uma dinamite prestes a explodir. Decidi perguntar:
- E então, o que você queria?
Respondeu:
- Te ver.
-Só isso?
-Não, lógico que não.
- Então o que mais?
-Sabe se tem algum filme decente em cartaz?
-Bom... tem alguns, de diferentes estilos. Ação, animação, romance...
Chegamos próximos à entrada do Mueller e, novamente, me encostei na parede. Fiquei observando Heloísa até que ela dissesse algo. Mas eu sabia muito bem o que eu queria. Ela era ideal para mim. Mas tudo o que é ideal, precisa ser transformado em real. Conhecia o suficiente para julgar que ela era tudo o que eu mais queria. Porem, não sabia se ela era comprometida ou coisa parecida. Então, impulsivamente perguntei:
- Escuta, você tá namorando?
-Ah... não. Aliás, nunca namorei.
- Que coincidência.
- Por que nunca namorou?
- Não encontrei a garota certa, ainda. Ou acho que encontrei.
- Hum... Quem?
Ao perguntar, ela se posicionou frente a mim, como se estivesse me interrogando.
- Uma tal aí que conheci recentemente, mas não estou certo de que ela veja algo em mim.
- E o que ela precisa fazer? - Perguntou-me como se fosse uma psicóloga ou conselheira amorosa.
- Me conhecer melhor.
-Ah é? E por que você acha que eu te chamei aqui? - disse, num tão bastante irônico. Confuso, respondi:
- É... o que?
Sou um burro.
- Oh, burrinho... Quando te vi no restaurante, logo percebi que você era um bom garoto. Fiquei curiosa para saber quem você era.
- Sério? Desde segunda-feira, eu só penso nesse par de olhos verdes hipnotizantes. Mas...
- Mas o que?
- Mas você... você - gaguejei- digo, eu... eu...- mais uma vez, gaguinho- ... creio que exista um processo a ser realizado. Tipo, mesmo tendo certeza que te quero, preciso te conhecer para passar ao próximo nível de um relacionamento. Mas sem nos tornarmos amigos, entende?
-Sim, e é isso o que eu quero! - E foi se aproximando - O que você quer?
- Você.

2010/01/28

Sabor, dedução, improviso e falta de informação

Desci do ônibus e fui diretamente ao seu encontro e, como de costume, nos beijamos intensamente. Depois de dois dias sem encontro algum, o mínimo que puderia fazer era dar o meu melhor, provar que estava com saudades.
-Poxa, Leo, da próxima vez eu vou contigo! - disse me abraçando fortemente.
-Seria ótimo, mas espero não perder mais um parente distante e ter que viajar às pressas.
-É, mas vamos sair daqui. Nunca gostei de rodoviárias.
Fomos caminhando, quando um cara estranho gritou, "O tetéia, volta pra minha casa!", e eu, como sempre fui calmo, não dei bola, seguimos em frente mas percebi uma certa angústia nos olhos de Michelle, então perguntei:
-Conhece esse maluco?
-... É... Não, lógico que não.
O homem não era velho, aparentava ter a nossa idade, mas não parecia ter sanidade mental. Mas, do nada, uma dúvida surgiu, na verdade, um desentendimento dentro de mim.
Quando beijei Michelle, não senti o mesmo gosto de sempre. O sabor do batom que ela sempre usava junto ao do chiclete que ela sempre mascava, adoro aquela mistura, mas naquele beijo, não senti nada parecido. Era semelhante ao cigarro que eu fumava, mas ela nunca teve vontade de fumar, e nem podia, por problemas de saúde.
Várias teorias iniciaram-se em minha mente... Teria ela me traído, enquanto eu estava chorando pela perda de um tio?... Teria ela começado a fumar?... Teria ela beijado outro garoto, ou garota?...
Sinceridade era o que eu mais prezava em um relacionamento, então decidi interrogá-la, mas antes, optei por beijá-la mais uma vez.
Atravessávamos a rua, quando retornei de meus pensamentos e instantaneamente disse para ela me beijar, ela perguntou "Aqui?", respondi "Agora!". E eu ainda não havia percebido que estávamos no meio da rua. Ela me olhando com um ar luxurioso, me puxou e beijou.
Analisei toda sua boca e seus sabores enquanto nos beijávamos. Não estava enganado, o gosto havia mudado, e analisando mais ainda, ela se comportava de um modo diferente desde a rodoviária.
Percebi que alguns carros buzinavam e empurrei Michelle, enquanto beijava, para a calçada. Quando uma certa fúria me possuiu, joguei a garota no muro, e comecei a interrogá-la:
-Confessa que você beijou outro cara! Confessa que aquele cara estranho não era desconhecido! Confessa que esse gosto da tua boca é de outro vagabundo! Confessa! Confessa que vocês se beijaram! Confessa, quenga!
Cheio de razão, pressionei aquele pequeno corpo contra a parede e lancei olhares fulminantes, esperando que ela confessasse tudo.
Silêncio... Sua expressão demonstrava que ela começaria a chorar, então eu disse:
-Ah, santinha, se arrependeu, é? Confessa!
- Você não sabe de nada!
Conseguiu se soltar dos meus braços, me encarou triste e irada ao mesmo tempo, então, com toda sua força, me deu um tapa na cara e saiu correndo rumo ao ponto de táxi mais próximo.
Poderia ter corrido atrás dela imediatamente, mas a dor era grande, fiquei desnorteado, como quando nos conhecemos. Voltei à Terra e corri, mas era tarde, ela já havia entrado em um carro e partido.
Não sabendo o que fazer, segui caminhando, encontrei um bar e decidi entrar para pensar no que tinha feito.
Duas horas depois, já familiarizado com os outros três clientes do bar, todos nós bêbados, me assustei quando meu celular vibrou. Os amigos riram do susto, e perguntaram o que aconteceu. Li a mensagem:
"Querido Idiota, se você estivesse a par das notícias, não teria apanhado e eu não teria fugido. Saiba que hoje é o dia do mês em que vou ao hospital, doar sangue. E por acaso,fui ao dentista depois. O doutor examinou minha boca e recomendou que eu parasse com os doces, pois estava ferrando com meus dentes. Depois disso, quando estava no elevador, indo embora, aquele "cara estranho" entrou e acendeu um cigarro (só não é mais louco que você) e coincidentemente, o elevador travou. Como eu estava frágil demais devido à doação, o cheiro de fumaça me fez muito mal, fiquei zonza e desmaiei. Me socorreram, e quando acordei tomei alguns remédios no mesmo hospital. Se você, ao invés de ficar lamentando uma morte desde quando desceu do ônibus, decidisse perguntar-me como estava, se aconteceu algo, perguntado sobre novidades, talvez eu não teria corrido de você e sua neurose por cheiros e sabores. E, não, eu não beijei ninguém além de você. Mas tenho uma notícia quente, a partir de agora, anuncio o fim do nosso namoro. Não me ligue, suma!
Como todo o ódio do meu coração, um beijo. Michelle."
Constrangido, fiquei sem palavras. Só ouvia os risos dos bebuns que estavam ao meu lado. Quando um deles disse:
-É, amigo! Haha! Se ferrou!