2015/09/28

Lonely People XIV


Com as visitas frequentes ao restaurante do outro lado da rua, aprendeu em conversas enquanto esperava pastéis, que as duas pessoas mais velhas que trabalhavam no balcão eram proprietárias do lugar e pais da moça bonita. Porém, por ser péssimo em lembrar nomes, demorava para lembrar os nomes dos membros da família.
Numa sexta-feira de expediente mais leve, tirando quando ocorre alguma tragédia, que não escolhe data para acontecer, fez uma pausa e atravessou para comprar lanche para ele e seus colegas. Entrou no restaurante e se assustou ao identificar a música que tocava na rádio de sempre do lugar. A versão a ser reproduzida não parecia pertencer ao perfil daquele público radiofônico. “Mas se eu já te perdi, como vou me perder? / Se eu me perdi, quando perdi você...”, cantarolou baixinho, lembrando imediatamente da psicóloga, enquanto esperava alguém lhe atender. Saiu da cozinha a dona, sempre muito receptiva:
- Oi, lindo, cê tá bem?
- Tudo certo, como andam as coisas por aqui?
- Tudo meio parado hoje, né? Parece que o povo tá desanimado e esqueceu que hoje é sexta.
- Eita, então agora cês vão trabalhar... - Disse, rindo, e fez o pedido.
- Cinco pastéis de queijo, dois de carne e dois de pizza, Marli, pra viagem. - Gritou a mãe de Ágata cujo nome Jean não lembrava.
O rapaz quis pagar a conta imediatamente e a dona puxou assunto:
- Vi um moço parecido com você esses dias ali na P. XIX d. D.
- Que dia? Sábado?
- Isso, era quase meio dia.
- Era eu mesmo! Como é que não te vi?
- Eu tava na R. P. G., quase na esquina, com a minha filha.
- A… - Pausa para lembrar o nome da moça - Esqueci o nome dela… Agnes? Sei que começa com “A”... Não, não é Agnes, espera, tem a ver com pedra preciosa.
- Ah, ela é preciosa mesmo, mas é Ágata. Agnes é pedra preciosa?
O rapaz se questionou de onde tirou a relação entre Agnes e pedras preciosas. Perguntou:
- Por onde ela anda? Faz tempo que não vejo ela por aqui.
- Ela tá internada…
- O quê? - Perguntou sem deixar a mulher terminar.
-... Em casa estudando. Fim de semestre, menino, ela fica louca de estudar.
- Ah é? O que ela faz?
- Engenharia química.
- Cinco pastéis de queijo, dois de carne e dois de pizza pra viagem! - interrompeu Marli, saindo da cozinha.

***

2015/09/21

Indigesto

Underneath the skin there's a human
Buried deep within there's a human
And despite everything I'm still human
But I think I'm dying here

Daughter, Human


Antes de machucar e abandonar (não exatamente nessa ordem, dependo do caso) quem estava a seu lado, a ponto de não conseguir - nem ao menos cogitar - pedir para voltar, pedir perdão, já tinha machucado e abandonado a si mesmo há tempos. Quando percebeu o desmoronamento, já estava com um pé preso numa coluna de metal pesado reforçada com desprezo e remorso, e conseguiu apenas se deixar ser engolido pela destruição
Apesar de destroçado, mantém firme seu orgulho, talvez o pouco de força que lhe reste é aplicada nisto, mostra que (ainda) é forte, que não sente falta, que não precisa de companhia, e talvez até convença outrem ainda com pouca intimidade que é autossuficiente e consegue se manter em pé e lúcido sozinho. No fundo de uma caverna que só ele conhece a entrada e permitiu até hoje o acesso de um número mínimo de pessoas, sabe-se que todo o esquema de um arranha-céu fundado autonomia e segurança é um holograma  para uma cabana de cobertores coberta por aflição e carência, vizinha de uma represa de lágrimas.
A cidade, a comida, a solidão, a companhia, o quarto, as ruas, os cigarros, o álcool lhe fazem mal, mas ainda assim insiste. Por mais que odeie tudo isso, no sentido de não suportar mais, sabe que sem isso tudo não é. Não existe. De qualquer jeito, se está bem em harmonia ou mal em melancolia, não existe - da maneira que gostaria de existir. Eis um paradoxo, não está satisfeito com o arranjo de sua existência, contudo desconhece uma forma, ou um caminho para tal, que poderia deixá-lo completo.
Não consegue engolir o que é, vomita, tenta novamente, os pedaços de sua essência que antes deslizavam suavemente pela garganta, como a mão de alguém que afaga o rosto do primeiro amor, passaram a agarrar a frágil carne e machucar todo e qualquer pedaço de sua mente, como os últimos dias de um romance arruinado.
Não se deve perder tempo para julgar a quem se atribui a culpa pelo desencadeamento da avalanche de estragos, pois várias pessoas seriam responsabilizadas por algo que fizeram, algumas até sem intenção de dolo. Memórias infelizes foram alocadas em algum canto do interior do ser em questão e incharam a ponto de causar uma explosão e muitas cicatrizes. O acumulador de mágoas desaprendeu a administrá-las, e, durante um porre possivelmente, deixou as gaiolas abertas dentro de seu peito e, com mãos trêmulas, sem controle, conseguiu apenas conviver com todas elas, deixando que o arranhassem e falassem por ele. Não culpava o passado nem o que as pessoas lhe fizeram ou disseram, a culpa era do conjunto que possibilitou tudo desandar de forma tão particular e desastrosa.
Pensava em portar um artigo de trinta e quatro páginas sobre como sua cabeça funcionava e consequentemente funcionavam seus comportamentos sociais ao se apresentar a alguém, fosse amizade ou amor em potencial, para que não se magoassem tão facilmente - quanto ele se magoava, às vezes, por nada - e entendessem que, se quiserem tal companhia, estariam entrando numa tempestade natural: descontrole e desespero.
Não espera compaixão de ninguém, nem ao menos que insistam em permanecer a seu lado por dó de uma essência tão desgraçada, deseja que fiquem porque sentem interesse por alguma de suas qualidades... Sim, tem algumas e acredita que são grandes… Não quer forçar ninguém a ficar e pensa em rasgar todo histórico vivido com a outra pessoa, caso julgar o distanciamento melhor que a dor de estar ao lado de alguém cada vez mais perdido. Não sabe se ainda é capaz de conviver em paz com quer que seja sem inesperadamente entrar em crise e desaparecer, mesmo que seja um desaparecimento apenas interno e não seja mais possível enxergar seu núcleo.
Por fim, chegou a um lugar em seu deserto onde não é capaz de fazer uma mensagem atingir qualquer resposta. A subliminaridade de seus gestos não tem mais o mesmo alcance, se é que tiveram alguma força anteriormente. A redoma de isolamento criada por ele mesmo torna delicado qualquer movimento de aproximação, que arrisca não só o distanciamento a se arruinar, como também todo o resto.

2015/09/14

For disgraceful lovers or What hope means? (Pity's jazz)

Hoping and waiting
for you to break my heart.

There will be one sad and cold day

that i will lay in the couch

totally damaged inside,
because of some hurtful true that
you
throw into my face,
i will be shedding not just tears
(so if I can do it, because now i can't)
but also all good things that i could probably
feel starting by the day you definitely enter in my life.
One of the reasons of my drowning will be
(I am pretty sure about the others, also you'll know)
the heavy burden of the truths about my very own afflicted being that you spell over my fragile and wounded flesh.
You will be right, i will be not able to disagree, that i'm addicted to melancholy and pessimistic thoughts about love, life and future, that all of this have the potential to destroy any expectations of a decent and not so tragic existence for us or even for me - in case you not care about me and if i'm away of your life.

I really don't know what i'm talking about, i'm just filling the silence with some words that could probably really mean something to you - or me or whoever wants to understand what this fucked up mind represents.

Hoping and waiting for you
to break my heart
after the hard speech about how i'm destroying everything near our galaxy.
My black hole is consuming our oxygen and all that we have built yesterday and before, this need to stop!, you'll say.
Hoping and waiting for
you
to watch me sleep,
desireing to put a knife in my throath and give a finale to my life,
but you'll be too terrified to do such a great act for the humanity,
because you'll know at some point before our colapse that i'm your yang for your yin,
because you'll need me as much as i'll need you.
Even tough we are
in a sacred way to think
too bad for each other.

Hoping and waiting for you to enter in the room
where i lay crying
and wake me up
saying that you will not sorry for all those words you had thrown at my face,
but you'll say that you'll stay with me on condition that i agree to have my heart broken once in a while because we both know that this is life: broken, disgraceful, tearful and all the things that will make we insist on us.

I hope to meet you
as soon as i excpect and wait to you to feel the same,
but, as we all know,
there is not a way to predict exactly when this colision will happen.
We only can continue to collide in other lovers and
let them wreck us 
and just so find ourselves in some 
deep blue sea
and maybe
(just maybe)
find some strength to emerge 
together
to some warm and hopeful beach
with some love and hapinnes etc
for us to enjoy
until
the storm come and
bring us down over and over again.

2015/09/07

Um (en)cont(r)o tamandareense (Bad timing)

Chegariam da escola. Almoçariam o de sempre porém adorado prato que suas respectivas mães preparavam. Assistiriam a seus programas de televisão favoritos antes da sagrada sesta vespertina. Cochilariam por meia ou uma hora até que primas(os) e/ou amigas(os) chamariam para brincar. “Você não vai sair sem escovar os dentes”, diriam assim ou algo parecido suas mães. “E ‘ai’ se voltar depois das seis”, alertariam. Pegariam suas respectivas bicicletas. Começariam a rodar pelos seus respectivos bairros até que alguém (do grupo dele) sugeriria um passeio até o 21 de abril, sem antes passar em casa pedir sete reais para mãe, pai, tio, tia, vó, vô, para pagar a entrada no clube; e descer até a Bapka (do grupo dela), pegando “aquela rua da Kabel” para pegar atalho pelo carreirinho daquele bairro estranho. Apostariam corrida até seus destinos, sabendo os locais em que adversários tinham como pontos fracos, para tirar vantagem disso, pedalando com mais velocidade nesses locais. Ao invés de seguir diretamente até a avenida principal do bairro, ela pegaria um atalho até a Wadislau. Ele não subiria pelo Contorno Norte, cheio de veículos em alta velocidade, como fariam os demais competidores; ao invés disso, daria tudo de si na subida da Nicolau para alcançar a Wadislau, e, ao passar sobre o viaduto, veria como estariam os demais ciclistas. Na descida da igreja São João Batista, contaria com o apoio da gravidade para ir com mais rapidez; empolgada, com vento lhe afagando o rosto, feliz, não perceberia o novo buraco na rua a cairia desgraçadamente, ficando com a cara estourada e pernas e pés também machucados presos a bicicleta. Ignorando a larga vantagem que tinha perante os demais, pedalaria incansavelmente na reta antes da subida da igreja até que presenciaria um acidente de bicicleta, veria um Marrocos vindo na direção da menina e um Lamenha no sentido oposto. Tentaria se levantar sozinha, em vão, com o queixo aberto jorrando muito sangue, e se arrastaria até o acostamento - naquela época ali ainda não havia calçada decente, só delgados trechos de terras nas laterais da avenida - com a ajuda de um estranho. Ambas competições seriam adiadas a fim de amparar a acidentada. Alguém da turma dela voltaria voando ao Buenos Aires para chamar algum adulto que saberia o que fazer. Pouco menos de dez minutos depois, a mãe de nossa protagonista chegaria de carro, pensando o pior, e daria um sermão na filha assim que visse que ela estava viva - apesar de coberta em sangue: “Quantas vezes já falei pra você não ir muito longe de casa com essa bicicleta?”. O garoto assumiria o papel de testemunha da defesa, dizendo que viu tudo, e afirmaria que não foi culpa dela, mas sim do enorme buraco, “aquele ali”, apontaria o culpado. A adulta ofereceria uma recompensa por sua benfeitoria, mas o menino negaria dinheiro, desejaria apenas que a mulher permitisse que, se a menina desejasse, eles pudessem brincar novamente, quando desvendassem uma maneira de se encontrarem sem que precisassem passar a pé ou pedalando pela avenida de ônibus que não exitariam em atingir alta velocidade não importasse a presença de crianças na calçada, melhor diria, no estreito acostamento. A menina também demonstraria interesse na possibilidade de um reencontro, independentemente se ele dissesse algo antes, e diria o bairro onde morava. “Minha tia e minhas primas moram lá! Você conhece a Andy?”, perguntaria ele. “Sim, ela é da minha sala”, contaria a garota, ainda com o queixo encharcado de vermelho. “Você é sobrinho da Neu? Lá do Monterrey?”, questionaria a mulher, e diria na sequência: “Muito obrigado, menino, mas, vamos, filha, a gente precisa ir até o postinho cuidar do teu queixo”. Poucas semanas depois, na segunda semana de maio, ele iria ao aniversário de sua prima Ari, irmã de Andy, e, assim que pedisse “benção” a todas as tias e a todos os tios presentes, esconderia alguns doces nos seis bolsos de sua bermuda e sairia para brincar na rua com a criançada. Ainda com curativo e pontos no queixo, sairia para ver o resto de sua turma andar de bicicleta na rua, não se recuperaria tão cedo do trauma da queda, e repousaria sob a sombra da grande árvore em frente a casa de sua colega de turma. Mesmo de longe, desejariam as duas crianças a troca de olhares e sorrisos. Seriam muito novos para cogitar a existência de “amor” ou o que quer que motiva casais dos filmes que assistiam nas tardes chuvosas presos em suas respectivas casas a lutarem para ficar juntos, não entenderiam tão cedo, contudo, gostariam de manter presença, por mais que a convivência até aquele domingo de maio se resumiria apenas a trinta minutos, na margem de uma via movimentada, após um acidente de bicicleta. Desconhecendo a existência ou o significado da palavra, sentiriam empatia um pelo outro. No aniversário, trocariam sorrisos receptivos quando seus olhares se cruzassem. Cansado de correr, sentaria-se ao lado da menina e perguntaria se ela gostaria de alguns doces da festa. Ela seguiria o estranho costume que tinha e teria por mais alguns anos de não comer em frente a estranhos e gentilmente rejeitaria brigadeiros e dois amores. Ficariam ali, sentados lado a lado, acompanhados na maior parte do tempo pelo silêncio na sombra d'árvore, enquanto o resto das crianças continuava a pedalar, correr, pular, chutar etc. Compartilhariam suas desventuras escolares e ela perguntaria sobre o motivo de ele estudar tão longe, poderiam estudar juntos, ela argumentaria, e, mesmo adorando a possibilidade, ele responderia que sua mãe preferia assim. Falando em progenitoras, a dela chegaria para o aniversário, pedindo que a filha a acompanhasse para falar com Neu e suas filhas. O menino as acompanharia e apresentaria sua mãe. As adultas se cumprimentariam e a tia da aniversariante descobriria que seu filho ajudou uma desconhecida a sair do meio da rua após uma queda de bicicleta. As duas mulheres conversariam até ser anunciado o momento de cantar parabéns. A amizade entre as duas adultas surgiria, beneficiando assim o contato entre as duas crianças. Chegaria a adolescência, acompanhada pelos dramas efemeramente eternos dessa época, encontrariam o conforto, a fuga, o afeto, o carinho, a amizade, o abraço, o beijo, o amor, a dúvida, outros abraços, a frustração, a saudade, a confirmação… Cresceriam e se mudariam para a capital, juntos, seriam conhecidos como um daqueles casais exemplares que se conhecem na infância e seguem juntos por muito tempo ou, talvez, até o fim.


Porém, um evento ou uma série de eventos cancelou o encontro, deixando que tomassem outros tombos e encontrassem outras dores, outros amores. Tudo o que poderiam viver, tudo o que poderiam sentir, se a colisão ocorresse naquela específica tarde no meio de suas infâncias, seria muito diferente se o acaso os unisse seis ou 533 anos depois. Talvez não se encontrariam em momento algum da vida, o que acontece com muitos possíveis romances, mas haveria outra pessoa para um amor tão encantador quanto aquele que surgiria numa tarde ensolarada e ensanguentada de abril na Wadislau.